sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
Tu Tens Um Medo
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Não ames como os homens amam.
Não ames com amor.
Ama sem amor.
Ama sem querer.
Ama sem sentir.
Ama como se fosses outro.
Como se fosses amar.
Sem esperar.
Tão separado do que ama, em ti,
Que não te inquiete
Se o amor leva à felicidade,
Se leva à morte,
Se leva a algum destino.
Se te leva.
E se vai, ele mesmo...
Não faças de ti
Um sonho a realizar.
Vai.
Sem caminho marcado.
Tu és o de todos os caminhos.
Sê apenas uma presença.
Invisível presença silenciosa.
Todas as coisas esperam a luz,
Sem dizerem que a esperam.
Sem saberem que existe.
Todas as coisas esperarão por ti,
Sem te falarem.
Sem lhes falares.
Sê o que renuncia
Altamente:
Sem tristeza da tua renúncia!
Sem orgulho da tua renúncia!
Abre as tuas mãos sobre o infinito.
E não deixes ficar de ti
Nem esse último gesto!
O que tu viste amargo,
Doloroso,
Difícil,
O que tu viste inútil
Foi o que viram os teus olhos
Humanos,
Esquecidos...
Enganados...
No momento da tua renúncia
Estende sobre a vida
Os teus olhos
E tu verás o que vias:
Mas tu verás melhor...
... E tudo que era efêmero
se desfez.
E ficaste só tu, que é eterno."
Cecília Meireles
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
Quatro Eras
Depois veio o tempo das mentes, quando as guerras só podiam ser vencidas com muita inteligência e estratégia. Livros, pouca paz, sabedoria. Um tempo de gênios, luzes e alta magia.
Por fim abateu-se sobre nós o tempo da ignorância, um tempo que quem menos sabe mais é valorizado. Dignidade e confiança não são mais postas a prova, conquistadas e perdidas.
São compradas e vendidas.
Mas virá, na hora certa, um tempo de simplicidade, o tempo das almas puras, corações grandes, espírito. Um tempo de contatos e grandezas, olhares e sutilezas. Um tempo que estagnará.
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
Conveniência
Os últimos suspiros de algo que já parece morto
Então, eu busco o porto
E espero que outros caminhos se façam com os ventos
Não há porque sustentar o que já desabou
Segurar o peso de tua culpa em meus ombros
Se meu desejo que era forte já se apagou
Nosso amor aos poucos se reduz a escombros
Não somos mais o que éramos a alguns meses
Ainda podemos tentar acertar algumas vezes
Mas talvez errar seja melhor pra nós dois
Pra ter de fato algo pra corrigir depois
Nós buscamos perfeições inexistentes
Nos queremos tanto de formas incoerentes
Esperamos mudanças e consolidações
Esquecemos lembranças e emoções
Somos o resto de anos de insistência
Em busca de um sentimento por conveniência
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
Sintomas
Essa solidão, essa amargura
Quis assim, do início ao fim
Agora eu alimento a criatura
Me protegi com essa mentira
Que me empurrou pra esse abismo
A queda é a justificativa
Que encontrei pro meu sofismo
Essa doença que me toma
Dia após dia, não tem cura
Essa tristeza é só sintoma
Faz de mim essa gravura
Depois que eu acordar do coma
Talvez retome a compostura
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
Da Volta
E sem nem saber a que
E mais uma vez eu não nego
Justamente por não saber o porquê
Mas não espero por nada
De mim e nem de você
Vou a guerra sem escudo e espada
Pronto pra mais uma vez perder
Me perco em outra cidade
Que eu já nem lembro qual
Só pra te ver, mais ninguém
Estranho é ter tanta vontade
Pra lutar pelo que me faz mal
E não aguentar o que faz bem
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
Intangível
Ó vazo de tristeza, ó grande taciturna!
E tanto mais te quero, ó minha bem amada,
Por te ver a fugir, mostrado-te empenhada
Em fazer aumentar, irónica, a distância
Que me separa a mim da celestial estância.
Bem a quero atingir, a abóbada estrelada,
Mas, se julgo alcançar, vejo-a mais afastada!
Pois se eu adoro até - ferro monstro, acredita! -
O teu frio desdém, que te faz mais bonita! "
Charles Baudelaire
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
Ano Novo
Trago sorrisos e tristezas, várias incertezas
Trago um pouco de tudo que resta de ti em mim
Trago inimigos e belezas, inúmeras riquezas
Já sei de cor as vias em que as pessoas são ruins
Com mapas de fortalezas não me perco mais aqui
Andei só por tantos dias, só eu e meu bandolim
Perdi a conta das durezas que passei por ti
E toda a solidão que eu ainda vou viver
Que venha com a certeza de que vai passar
E pra toda a razão que eu perdi por você
Que eu tenha a firmeza pra reconquistar
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Lábios
Ele não tinha um horizonte definido a visitar
Ele estava cansado.
Passava superficialmente em cada lugar
Nunca tivera raízes e as queria
Nunca fora notado, mas como se achava bonito.
Ele cantava.
Um grito silenciosamente alto
Queria um amor.
Mas ele estava cansado.
Viajava por todas as luas.
Preenchia linhas imaginárias.
Estava em todo lugar e ao mesmo tempo não estava.
Sussurrou...
Sussurrou...
Sussurrou...
Ele se apaixonou.
Encontrou um rosto para acariciar.
Lábios que beijavam suas canções.
Até o vento tinha alguém para amar.
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
Soneto de Dezembro
Toda vontade vai embora
Mesmo com toda a demora
Todo grito silencia
Toda certeza fica incerta
Toda beleza se apaga
E a esperança fica vaga
Quando o coração aperta
Mas o que se vive de verdade
Não nos deixa num instante
Como um desejo que tem fim
Permanece então saudade
E a dor contagiante
Que é você, dentro de mim
Amadurecência
O primeiro senso é a fuga.
Bom...
Na verdade é o medo.
Daí então a fuga.
Evoca-se na sombra uma inquietude,
uma alteridade disfarçada,
Inquilina de todos os nossos riscos...
A juventude plena e sem planos... se esvai
O parto ocorre.
Parto-me.
Parto-me.
Parto-me.
Aborto certas convicções,
Abordo demônios e manias.
Flagelo-me.
Exponho cicatrizes
E acordo os meus, com muito mais cuidado,
Muito mais atenção!
E a tensão que parecia nunca não passar,
O ser vil que passou pra servir...
Pra discernir...
Harmonizar o tom,
Movimento, som.
Toda terra que devo doar,
Todo voto que devo parir,
Nunca dever ao devir,
Nunca deixar de ouvir...
com outros olhos."
Fernando Anitelli
sábado, 18 de dezembro de 2010
Melhores Dias
Devolva a paz que eu fingi não ter
E todas as noites mal dormidas
Devolva as cartas de despedida
Devolva o silêncio que me irritou
Devolva todo o meu tormento
Devolva enganos, ressentimentos
Devolva tudo e não esqueça nada
Me deixe em paz pra morrer de amor
Devolva os danos que eu te causei
A minha carne presa em teus dentes
Devolva todos os meus pecados
Meu coração mesmo que em pedaços"
Renato Godá
Cabaret
Cigarros, whisky, pouca luz
Versos ruins
Bêbados condenados
A vida noturna que não acaba
Não começa, não tem fim
As marcas vermelhas de batom
Minha vida é múltipla
Cigarros, whisky, minha cruz
Dias ruins
Poemas apaixonados
Carta soturna da estrada
Que não começa e não tem fim
Esperança de mudar de tom
Sua presença é única
Cigarros, whisky, tua luz
Em botequins
Homens entregados
A taciturna vida passada
Que atravessa, passa por mim
Procurando algo de bom
Entro em metafísica
Cigarros, whisky, o que isso induz
Os bandolins
Sons sujos, embaçados
A vida noturna acabada
Que recomeça e vai ter fim
Que nasce e morre em som
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
A Quem Só Se Contradiz
E toda voz e qualquer som
E tudo o que restar de bom
E tudo o que a gente quis...
Tua verdade já não condiz
Com a realidade que nos prende
Dia após dia o amor se rende
Aos teus inúmeros perfis
Permaneço um aprendiz
Do seu domínio inconsciente
Permaneço um inconsequente
Perante ao que a vida diz
Descontruo tudo o que fiz
E levo embora a cicatriz
Cansei da vida por um triz
Que só assim te faz feliz
Atualidade Emocional
Fiódor Dostoiévski
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
Loucos e Santos
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril."
Oscar Wilde
Algum Lapso de Compreensão
Talvez nem exista razão
Talvez seja orgulho ferido, desmedido
Ou talvez seja simples paixão
O fato é que ainda andamos sozinhos
Vagando entre o sim e o não
Ainda buscamos avisos e caminhos
Qualquer indício de fim pra solidão
Talvez nosso tempo passe veloz
Talvez sobre a falta de convicção
Talvez ainda não entendemos o "nós"
Talvez falte espaço no teu coração
Talvez nosso destino pareça atroz
Mas isso é parte da nossa (in)decisão
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Crônico Irônico
Tantas certezas apagadas e várias outras pra mudar
Tantas noites mal dormidas, tentando te esquecer
São tantas rotas divididas para a gente se perder
Ainda não sei onde erramos, nem sei ao menos se acertamos
Talvez o que nós dois amamos seja ver tudo esvaecer
Nem sei se nos esforçamos, se tentamos entender
O que pra nós se parecia com o sentido de "alguém ter"
Acho que nosso problema sempre foi o que nós éramos
Maravilhosamente errados um pro outro,
Terrivelmente certos separados.
Talvez nosso maior erro
Foi ter tentado acertar
O que era bem melhor errado
sábado, 11 de dezembro de 2010
Os Baralhos dos Coringas
Digo tanto que vou tomar coragem pra mudar todas as coisas que, há muito, me incomodam em mim mesmo. Ironicamente, hoje nem ao menos tenho a coragem pra conversar com os outros sobre essas coisas que me incomodam.
Aos poucos criei uma imagem de mim mesmo que de forma alguma corresponde com a realidade. Impus respeito pelo temor, criei vínculos por conveniência e os fortaleci pela necessidade, necessidade que tinha de não estar só, mesmo jamais estando inteiramente acompanhado, e uma necessidade que os outros tinham do que eu podia lhes dar, seja isso uma dose de algum conhecimento oculto, que por alguma razão só eu tive acesso, ou outro motivo qualquer.
Engraçado, é ver como isso aos poucos se tornou também a imagem que eu tinha de mim mesmo.
A ocasião fez de mim um personagem que eu abracei e ainda hoje não penso em largar.
A ocasião me fortaleceu, me deixou impenetrável. Não sinto nem os meus sentimentos e, por isso, não enxergo nada que venha dos outros.
Transformaram-me em um líder que eu sempre quis ser por motivos que eu nunca escolhi. Hoje lido com feridas que causei em mim mesmo, atacando o espelho.
Cada pessoa que tirei da minha vida saiu como uma carta que sai do baralho. Unitariamente nenhuma delas me fez falta, mas aos poucos já não haviam cartas... Só coringas, que eu nunca saberei se estão no meu jogo ou se jogam comigo.
domingo, 5 de dezembro de 2010
Se Par Es
E mil estradas de saída
Haviam rostos e olhares
E a consciência dividida
Haviam medos e pesares
E alguma alma deprimida
Haviam valsas e certos pares
E um belo ritmo pra vida
sábado, 4 de dezembro de 2010
Só
Mergulhada nos olhares absortos que te gritam
Seu perfume paira procurando meu corpo só
Vem e pinte um sorriso em meu rosto
Abraça forte minha alma para que ela fique cheia de ti
Ela quer voar, se elevar.
Quero contigo tecer sonhos.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Versos
Pedaços de sorriso, branca espuma,
Gargalhadas de luz. cantos dispersos,
Ou pétalas que caem uma a uma.
Versos!… Sei lá! Um verso é teu olhar,
Um verso é teu sorriso e os de Dante
Eram o seu amor a soluçar
Aos pés da sua estremecida amante!
Meus versos!… Sei eu lá também que são…
Sei lá! Sei lá!… Meu pobre coração
Partido em mil pedaços são talvez…
Versos! Versos! Sei lá o que são versos..
Meus soluços de dor que andam dispersos
Por este grande amor em que não crês!…"
Florbela Espanca
terça-feira, 30 de novembro de 2010
Sangrando Poesia
Essa doença que me toma a cada dia
Estes braços já não tem mais serventia
Depois de tanta vontade sem verdade
De onde vem essa saudade?
Essa descrença no que há pouco existia
Estes passos já não seguem mais um guia
Perderam-se no meio da realidade
Pra onde foi o meu bom senso?
A razão, motivando a decisão
Sumiu entre uma ou outra explosão
Das guerras que travo e nunca venço
Pra onde foi o que eu penso?
Fundiu-se a alguma tentação
Hoje se baseia em ilusão...
Na busca por algo mais intenso
Hoje covarde, sem chance de mudança
Preso a nostalgia, sangrando poesia
Esse rosto tenso, reflexo do que valia
Essa solidão, hoje sem mais esperança
domingo, 28 de novembro de 2010
Gim
É doloroso ver o tempo acabar
E saber, no fundo, que já vai me deixar
Ler nos teus lábios o meu real valor
Mas quem sabe deva eu sempre esperar?
Nesse silêncio que é você, esse torpor
Quem sabe não sentes, se não, a mesma dor?
Talvez ao fim de dias venha me buscar
E o tempo segue lento, segue o vento
Segue qualquer coisa, tão longe de mim
E ao chegar encaro esse tormento
Talvez a luta mude tão terrível fim
Dou costas para magoas, afogo em gim
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Se Já Não Sentes Nada
Há tão pouco feito e já apagado
Resta agora o peito machucado
Ou já não resta nada, além do medo
E das vontades em que se afundava
Será que sobra enfim algum desejo?
Procuro em tanto sonho e não vejo
Nenhuma essência em que se baseava
Não há algum rastro ou alguma pista
Não ha nenhum traço de esperança
Talvez na chuva tenha se dissolvido
Não há nenhum porto ou terra a vista
Se estás aqui meu olhar não alcança
Nenhum vestígio de coração partido
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Fim da Utopia
Já não sei nada de mim...
Eu grito tudo de mim aos ventos
É tanto início e tanto fim
Que eu já esqueci todos os meios
E os receios que te levam de mim
Eu já tenho tantos documentos
Que não me dizem quem sou eu
De que essência eu sou feito
Ou se tudo isso se perdeu
Minhas semanas duram meses
E tenho o ano como o dia
Busco em todos os fatores
Alguma antiga alegria
Talvez esse seja o indício
De que a vida já não vale
O esforço pra se manter vivo
Quero que o mundo se cale
Quero que o teu tempo pare
E que o meu te acompanhe
Que o teu olhar repare
Tua mão no ar me apanhe
Quero que o céu caia aos poucos
E que o vento se desfaça
Quero meu coração de volta
E outra vontade falsa
Quero não querer mais nada
E dançar uma outra valsa
Quero respirar
Algum ar mais puro
E me apagar
Me tirar do meu futuro
Se é que existe algum destino
Se é que existe outra poesia
Se é que existe uma tristeza
Que não seja só melancolia
Se é que existe uma resposta
Um paradigma da existência
Se é que existe algum retrato
Que não mais me angustia
Se é que existe no teu rosto
Algum traço de vontade
Se é que existe no meu peito
Algum rastro de vivacidade
Se é que existe uma palavra
Pra descrever a experiência
Se é que dentro de você
Algum desejo persistia
Vivo apenas por viver
Não mais por necessidade
Acabou-se a utopia
Foi junto com a realidade
Despedida
que está onde as outras coisas nunca estão
deixo o mar bravo e o céu tranqüilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces ? - me perguntarão.
-Por não ter palavras, por não ter imagem.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras ? -Tudo. Que desejas ? -Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação ...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão !
Estandarte triste de uma estranha guerra ... )
Quero solidão."
Cecília Meireles
terça-feira, 23 de novembro de 2010
Paradigma
Essa sombra, esse desejo
Esse medo sem tamanho
De um futuro que prevejo
Que homem é esse que escreve?
Já nem sabe do que fala.
Essa existência tão breve
E que tão cedo já se cala
Que espécie de poeta sou?
Que não sabe ter um ser amado
E se julga sempre condenado
A escrever do que restou
Em que planeta agora estou?
Vejo em frente tantas luas
Tantas cores, puras, cruas
Toda cor que me inspirou
E agora, pra onde devo ir?
Sequer existe algum caminho?
Haverá um modo de fugir
Ou o certo é enfim ficar sozinho?
Que poeta é este? Silenciado
Nem mesmo vive um dia a dia
E continua aqui sentado
Inventando alguma alegria
Há espaço pra mim no escrevo?
Talvez dentro de tanto coração
Que entreguei sem ter razão
Canceriano, eu me descrevo
"Fiz da emoção meu paradigma
Pra escrever "poesia digna"
Me contentando com sorrisos
Ignorando todos os avisos"
Não me preservo e nem desfaço
Não sou inteiro, pois me entrego
A tristeza segue em meu encalço
Companhia que eu não nego
A cada noite uma lua apaga
E junto dela vão meus versos
Talvez essa seja minha saga
Viver vagando em universos
De poeta... só os meios
Transcrevo a vida que me lembro
E cada um de meus receios
Que hoje são tudo que tenho
Futuro hoje pouco importa
Pois nem eu sei o que eu quero
Nem sei mais se te espero
Ou vou embora e fecho a porta
Minha liberdade é lenda
Minha vontade é resto
Minha vida, escrita, a venda
O que sobrou é o que detesto
O Mundo É Um Moinho
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Preste atenção querida
Embora saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões à pó.
Preste atenção querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás a beira do abismo
Abismo que cavastes com teus pés"
Cartola
Ansiedade e Frustração
Ansiedade, frustração
Ansiedade, frustração
Ansiedade, frustração.
Meio ano em pura angústia
Imerso em tanta solidão
Me desmanchando em vários versos
De ansiedade e frustração
Não há paz nem na alegria
Em nenhuma dimensão
Sou em meus vários universos
Ansiedade e frustração
Nem quando tudo enfim se acerta
Nada passa de ilusão
Sente-se e espere a certa
Ansiedade e frustração
Nem no fim estamos livres
Elas nos prendem a algum chão
São as únicas certezas firmes
Ansiedade e frustração
Traze-me
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traze-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
-Vê que nem te digo - esperança!
-Vê que nem sequer sonho - amor!"
Cecília Meireles
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Soneto ao Silêncio
E um gole pra que eu cale
Um leve medo nos teus olhos
Refletido no que quer que eu fale
Não sei porque recorro ao vinho
Pra te ter aqui por perto
Talvez por não saber ao certo
Se é real ou só miragem do caminho
Sei que sigo tantos passos
Só por sentir que vem de ti
Só por ver-te no horizonte
Crerei em tudo que me conte
Só pra te ter comigo, aqui
Pra te ter presa em meus braços
domingo, 21 de novembro de 2010
Silenciado
Já tentei achar em outros
O que só existe em mim
E agora, tão perto do fim
Meus olhos se abrem, aos poucos
Já lutei contra tanto vento
Tentei viver temores loucos
E segurar o estopim
De uma guerra entre o ruim
E o pior de mim, já soltos
Eu já tentei concertar tudo
E não ficar aqui parado
Me sentindo assim, aliviado
Por escrever e ficar mudo...
Meu Sonho
para teu rosto se mirar.
Mas só a sombra dos meus olhos
ficou por cima, a procurar...
Os pássaros da madrugada
não têm coragem de cantar,
vendo o meu sonho interminável
e a esperança do meu olhar.
Procurei-te em vão pela terra,
perto do céu, por sobre o mar.
Se não chegas nem pelo sonho,
por que insisto em te imaginar?
Quando vierem fechar meus olhos,
talvez não se deixem fechar.
Talvez pensem que o tempo volta,
e que vens, se o tempo voltar."
Cecília Meireles
quarta-feira, 17 de novembro de 2010
Papel Nosso De Cada Dia
Me tomou só pelo prazer de uma conquista
E se fez de herói como qualquer artista
Seu toque nunca foi como pensei que fosse
Nem sua tristeza era concreta
Fingiu sofrer só para ser poeta
Enquanto o mundo todo em volta estremecia
Desaba(fa)ndo em coisas que você nem sentia
E agora o que me resta, além de solidão?
Um recado no espelho e um sorriso de anteontem
Um cinzeiro cheio de pontas apagadas e frias
Eu sei que seus passos e acasos não mudarão
E que escutarei tudo que, sobre ti, me contem
Apenas pra preencher minhas noites tão vazias
Mais Um Epitáfio
Em que olhos eu deixei o meu sorriso
E que sorriso ainda guarda meus olhos?
Diga-me quando foi que esqueci de quem preciso...
Onde eu deixei minha razão, minha ilusão?
Troquei tudo isso por meio coração
Que já veio partido, suprimido em solidão
Onde eu deixei o que fazia sentido... ou não
Diga-me, quando foi que eu perdi pra mim
Pra só hoje entender que nem ao menos fui meu inimigo
Pra entender que só comigo podia estar inteiro...
Pra buscar em outros um eu verdadeiro?
Diga-me quando foi que deixei de ser essência
Pra andar por aí recriando uma existência
Que eu nunca construí pra mim
Porque eu nunca quis que tudo fosse assim
Mesmo que seja assim
Conte seus passos pra que eu feche seus espaços
Leve os teus traços pra que eu apague os seus rastros
Pra que limpe da memória os teus abraços
Pra que não sinta mais teus braços
Que me desprenda de tantos e tantos laços
Que me prenderam a tanto tempo...
Grite ao vento, todas as suas verdades
Suas vontades antigas e escondidas
Suas ilusões reprimidas e palavras contidas
Não me poupe de nada, nada
Eu escolhi ser assim
Eu escolhi não ter fim
Eu escolhi só você
Mesmo que nunca pra mim
terça-feira, 16 de novembro de 2010
Só
Bem como um cão sem dono e que o procura,
Mais pobre e desprezada do que Job
A caminhar na via da amargura!
Judeu Errante que a ninguém faz dó!
Minh’alma triste, dolorida e escura,
Minh’alma sem amor é cinza e pó,
Vaga roubada ao Mar da Desventura!
Que tragédia tão funda no meu peito!…
Quanta ilusão morrendo que esvoaça!
Quanto sonho a nascer e já desfeito!
Deus! Como é triste a hora quando morre…
O instante que foge, voa, e passa…
Fiozinho de água triste…a vida corre…"
Florbela Espanca
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Apelo Coletivo
E eu já nem escuto mais
Casos e acasos, quem liga?
O importante é ter onde chegar
Falam me sobre amor e morte
Já nem vejo nada demais
Aceno e digo "prossiga"
Pra o assunto não se alongar
"Fale a todos, se importe"
Já nem me deixam em paz
Afinal, o que querem que eu siga?
Alguma nova idéia vulgar?
"Abaixe a cabeça, se porte"
Penso, que diferença faz?
Seja lá o que for que consiga
Pra mim nunca, nunca vai mudar
--
E agora, o que é azar e o que é amar?
Será que só temos de morrer pra ter sorte?
E afinal, se calar é melhor do que nada falar?
Será que acharemos algo que nos importe?
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Não é Nada
Nem espere nada certo
Não complique... simplifique
Apenas saia de perto
Não ache nada, não sinta nada
Não serei nada pra ti, pra mim
Não quero ser a escolha errada
O arrependimento no fim
Não me escute. Não me fale
Sobre todos os seus anseios
Ou se contente com um não
Não pergunte, mas não cale
Fiquemos loucos em devaneios
Seremos você e eu em solidão
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
A Encruzilhada
Sentado em sua perfeita interseção estava um velho, sujo e vestido em trapos pretos. Ao ver o jovem se aproximar levantou as mãos, como um sinal.
Venha... Venha me escutar
Pra não falar do que não cabe
Nem esquecer do que se sabe
É melhor nem começar
Só pra quem crê em alma vasta
Pra quem meia palavra basta.
Pra esse eu vou me apresentar...
Sou a maldade em pessoa
Mas também sou uma boa
Pra quem souber observar
Coração bem analítico
Meio senso, crítico
Os limites de agir e pensar
Pele fria e sangue quente
Dono do desejo mais ardente
Que é o de dominar
Enfim, irei ao que interessa
O clímax de minha peça
Está para começar (mas vai passar)
Eu sou o nada, sou o tudo
E no espaço de um segundo
Posso até mudar o mundo...
Se você me deixar entrar
E quando já não for mais cedo
Com um simples toque de um dedo
Apago e crio todo o medo
Que seu coração suportar
Eu sou quem te compõe em notas
Em letras de um mapa, canções, rotas
E do caminho sou as voltas
Sou Morfeu, se alguém sonhar
Sou dono de sua vontade
Em seu espelho sou a vaidade
E se quiser tua liberdade
Eu me prendo ao teu olhar
Sou. Sou, fui e vou sendo
Dentro do peito vou vivendo
E na cabeça vou esquecendo
Qualquer conceito de amar
Calma, não faça alarde
Espere o fim de tarde
Pra que em sombras possa andar
Prometo, não te sigo
Embora siga contigo
Sempre a te vigiar
E quando olhares para trás
Os dois caminhos verás
Onde eu sigo a esperar
E ao próximo que tiver o azar
De se perder pra me achar
Bom, já saberei o que falar
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Metade
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também."
Oswaldo Montenegro
sábado, 6 de novembro de 2010
Nada Real
Olhos manchados sentimento escondido
Era só um e só mais um a sós
Mãos tremulantes e um medo na voz
Era algum alguém, alguém qualquer
Que vive o dia sem saber o que quer
Era brilho talvez ou só reflexo
Tão simples por ser complexo
Ela não era o que queria ser
Não devia, não podia, queria temer
Não era nem foi, nunca feita pra dois
Não era de pensar no que fazer depois
Tendia pro nada, esquecida ou lembrada
Rodava sempre assim, na mesma estrada
Sempre parando nos mesmos pontos
A mesmas personagem de tantos contos
Eles? Acaso, costume, destino
É assim, ou salário ou cassino
Eles eram limites, ou só limitados
Eram raríssimos sorrisos roubados
Eram a síntese do que não se controla
Coração ou cabeça, saudade que assola
Os dois que nunca seriam dominados
Mais uma vez hoje juntos, tomados
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
Pegadas
Seus pés então param, sem ter pra onde correr
Estás parada em meu mundo a esvaecer
Sua boca se meche, mas a voz só mente
Não está aqui, nem em lugar algum
E vês cada um passar sendo só um
Pertences a si e a homem nenhum
Enquanto o chão segue em sua frente
E eu estou aí, na sua sombra, no muro
Decidido a pular, a refazer um futuro
Contudo seu rastro se esconde no escuro
Siga. A mente para, mas o corpo consente
Teus braços, nem sei se me tem
Nem sei se o queres também...
Pois se teus olhos não me vêem
Teu coração não me sente
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Hoje Eu Quero Lhe Falar...
De nada mais preciso, nada quero
Em ti nada procuro, nada espero
Só o mundo inteiro que seu corpo arrasta
Me envolva hoje, como sempre fazes
E nada mais eu digo, eu calo
E só o que quiser ouvir eu falo
Seja de mim ou de outros rapazes
E deixa eu me perder em qualquer gesto
Deixa que minha dor somente eu choro
E ainda assim em cada lua melhoro
Deixa que meu amor eu mesmo testo
Deixa que meu caminho eu mesmo traço
E passando por você é bem melhor
E cada passo do caminho eu sei de cor
E no fim, só me guarde em seu abraço
terça-feira, 2 de novembro de 2010
Certamente
Se achar é só um modo de pensar no que é bom
Então ache, enquanto eu acho você, no céu que cai
Se ficar é se apagar perante tantos olhos certos
Quem sabe me queimar é te esperar, braços abertos
Quem sabe que não sabe, certamente, sabe demais
Olhe para o céu, hoje a noite, meu bem
Veja como as estrelas já não brilham mais por ti
Veja como a lua não quer mais ficar aqui
Veja, a noite vai. Sinta como o medo vem
Mas continue olhando, vigiando pontos que caem
No fundo, queres um pra si, eu sei
E o mundo, reles peça que eu criei
Já não serve mais, pois tantos outros lhe atraem
E se encontre de verdade em outras cores
Enquanto eu te procuro em outros amores
Outras dores virão, com a certeza de outro dia
Quem sabe outros sabores pra essa vida fria
Só não espero que me aguardes
Bem melhor que isso, me guardes
Como doce e passageira recordação
Um rosto qualquer em qualquer ilusão
E se achar será se perder, perder um som, um plano
O bom da vida será o tempo passando de ano em ano
Eu acho você e não me acho mais em nada
Te apagar só pra ficar de olhos abertos
E me queimar, em outros braços, incertos
Sei nada, enquanto seguir a estrada errada
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Da Noite Passada
Existem dias que a convivência consigo mesmo é insuportável, bem, aquele era um desses dias.
O despertador tocou e ele se virou na cama, "hoje não, por favor", foi tudo o que ele conseguiu falar diante da música que saía do celular, como se o seu apelo fosse impedir que seus ouvidos escutassem. Bom, não foi o suficiente. Ele se levantou e foi tomar um banho. Nada mais lastimável do que ficar em um estado misto de sono e desespero debaixo da água que cai do chuveiro, mas a idéia de que tinha um dia inteiro pela frente não lhe saía da cabeça e devorava grosseiramente sua tranquilidade.
Nem mesmo as boas notícias do dia anterior conseguiram lhe resgatar do poço que é viver todos os dias, sem excessões, e ele seguia na calçada amaldiçoando o vinho da noite passada. Aquele vinho barato e de qualidade duvidosa, mas que era, no fundo, uma de suas paixões.
Sentou-se no meio fio, no meio que um lugar qualquer, e acendeu um cigarro. Algo tinha de lhe manter acordado e com certeza seria o fumo. Entretanto, seu estado de embriagues derivada do sono lhe proporcionou uma ilusão que consistia em se desligar do mundo. Enquanto a fumaça saía devagar de sua boca o mundo a sua volta parou. O tempo parou. E ele, bem, cochilou.
Não foi um cochilo longo, mas duradouro o suficiente para caber um sonho. Sonhou que os relógios de todo o mundo haviam parado. Isso sim era um sonho pra ele. Dentro de sua cabeça ele começou a recordar todos os momentos em que disserá que queria que o tempo parasse e uma conversa em especial lhe "prendeu a atenção". A conversa da noite anterior, quando ele recitou o velho jargão de todos os dias: "Queria que o tempo parasse pra gente" e a resposta tal qual sutíl: "Pena que se o tempo parasse pra gente o tempo do resto do mundo continuaria correndo". É, o tempo continuaria correndo.
Acordou por fim, com o que restara de seu cigarro lhe queimando os dedos. Olhou o relógio e constatou mais uma vez. O tempo continuou, e continuará sempre, correndo.
terça-feira, 26 de outubro de 2010
Nó na Garganta
Silêncio quando falo
E no fundo não me calo
No fundo só me escondo
As vezes falta a palavra
Em minha garganta calo
Nem sou, vou pelo ralo
Me abro com um estrondo
Falta a fala, sobra voz
Sinto silêncio, me calo
Um verso se forma lento
Um vazio mudo entro nós
E sobre o resto nem falo
Tudo se desfaz no vento
domingo, 24 de outubro de 2010
Cantante
Ou que tudo seja um tanto
Mas pra quem procura encanto
Antes nada do que um louco
Sei que a sorte é o acaso
E que o azar sou eu quem faço
Mas seguir o mesmo traço
Deixa tudo tão mais raso
Pra os que são sem nada ser
E que andam sem cessar
E Procuram o que buscar
Os que sonham sem viver
Que nada querem por querer
Imerso em medo de errar
No topo de um mal estar
Que está a muito a crescer
Sei, o tempo não é certo
Sei, o certo não é meu
Que o errado me escolheu
Pra andar sempre por perto
Sei de tudo que mudei
E que mudaram muito em mim
Que o final só é o fim
Porque no fundo me cansei
Futuros são só dias
E passados não passaram
Presenteados transformaram
O presente em várias vias
Agora junto agonias
Pra o que os dias me lembraram
E tudo o que marcaram
Eu transformo em poesia
No Silencio dos Seus Olhos
Em que outra humanidade se aprendeu
A palavra que ordene a confusão
Que neste remoinho se teceu?
Que murmúrio de vento, que dourados
Cantos de ave pousada em altos ramos
Dirão, em som, as coisas que, calados,
No silêncio dos olhos confessamos?"
José Saramago
sábado, 23 de outubro de 2010
Oito Caminhos Adiante
Compartilhado segredo
Nada demais até então
Depois de outra maneira
No precipício, na beira
Nós, tão longe do chão
Nosso tempo passou lento
Do tempo veio mais tempo
E nós sem mais tempo pra dar
E havia tanto espaço
Ainda erramos o passo
Acabamos sem um lugar
E havia tanto caminho
Bem dentro daquele vinho
Agora nada nos resta
Nem momento de pura paz
Nem nada que me satisfaz
Nem beijo, choro ou festa
Só sigo adiante por mim
Ou por não temer mais o fim
Ou por ter outro sorriso
Sei o que carrego nas mãos
E outros dias, loucos ou sãos
Serão tudo que preciso
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Ai, Palavras!
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai palavras,
sois o vento, ides no vento,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova!
Ai, palavras, ai palavras,
que estranha potência, a vossa!
Todo o sentido da vida
principia à vossa porta;
o mel do amor cristaliza
seu perfume em vossa rosa;
sois o sonho e sois audácia,
calúnia, fúria, derrota…
A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora…
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil como o vidro
e mais que o são poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam…"
Cecília Meireles
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
Outro Dia
Já não me sinto mais
Já não preciso mais
De lutar por paz
É fácil pra quem quer ver
O passado ficou para trás
O futuro ficou para trás
E pra nós agora tanto faz
Agora busco outro caminho
Viver algum outro dia
Buscar outra nova alegria
E não me ver mais na poesia
E veja, já não estou sozinho
E não resta pra nós a agonia
E nem outra conversa fria
Nenhuma atitude tão vazia...
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
Momento
Juntos como um, uma sombra e só
Dividindo tudo o que lhes dava a lua
Juntos em um só embalo, um só passo
Juntos como se presos por nó
E as marcas no chão, o tempo, o espaço
E tudo o que havia além deles
Nem mesmo a seus olhos chegava
Nada no mundo importava, só eles
E tudo se ignorava, em tempo...
Parecia-lhes que o tempo aumentava
Pra um embalo lento, pr'O momento.
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Cedo
Ainda tenho o mesmo olhar triste
Não sei nada sobre um fim
Sei: existe
Sei que o par é como o ser
E sei o que isso pode parecer
Se o ser acaba de repente
Seria o par diferente?
Sei também que cada fim
É muito mais que só, assim...
É muito mais que fim, e só
É um recomeço...
Da cinza, do pó
Outra chance de evitar o tropeço
E ainda há caos dentro de mim
Suficiente pra nós dois
Pra tudo o que passar agora
E pra depois.
E ainda é cedo pra esperar
E pro que não foi, mudar, crescer
É cedo, muito cedo
Pra sofrer
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Primavera Nos Dentes
Quem tem a força de saber que existe
E no centro da própria engrenagem
Inventa a contra mola que resiste
Quem não vacila mesmo derrotado
Quem já perdido nunca desespera
E envolto em tempestade decepado
Entre os dentes segura a primavera"
Secos & Molhados
domingo, 17 de outubro de 2010
Tentativas
Juro que tentei...
Tentei apagar nosso passado
E te apagar do meu presente.
Tentei te tirar do meu lado
E ignorar o que você já não sente...
Tentei não sentir mais nada.
Juro que tentei...
Tentei não ficar estagnado
E sem você seguir em frente.
Vi que nada sera mudado
Por mais que eu mude realmente.
Sabe,
Algo de fato mudou
Talvez toda a dor que sua imagem me causou
Talvez o conformismo com aquilo que restou...
Sabe,
Algo pra nós acabou
Sei que nada é pra sempre, pra você ou pra mim
Mas sei que o que a gente sente não terá mais um fim
Acho que tentar nunca é o suficiente,
Nem sentar e esperar algo mudar na gente
Mas agora sei onde você está
Sei onde é o meu lugar
Sei que nada mais vai mudar
Por mais que eu (não) tente.
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
O Inimigo
Onde raro brilhou a luz d'um claro dia;
Tanta chuva caiu, que quase não existe
Uma flor no jardim da minha fantasia.
E agora, que alcancei o outono, alquebrantado,
Que paciente labor não preciso — ai de mim! —
Se quiser renovar o terreno encharcado,
Cheio de boqueirões, que é hoje o meu jardim!
E quem sabe se as flor's ideais que ora cobiço
Iriam encontrar no chão alagadiço
O preciso alimento ao seu desabrochar?
Corre o tempo veloz, num galope desfeito,
E a Dor, a ingente Dor, que nos corrói o peito,
Com nosso próprio sangue, a crescer, a medrar!"
Charles Baudelaire
Teu Sono, Meu Sonho
Em que tudo há de se acertar
Que talvez você possa acordar
E não mais passar, como se vento
Nesse despertar fantasiado
Quero poder estar a teu lado
Quero não calcular e nem saber
Mas te sentir e até te viver
Faça do nosso dia a sua noite
Faça do meu sonho nossa vida
Faça que eu não pense, que seja
Mesmo que o vento nos açoite
E que o caminho nos divida
Onde quer que eu vá, que esteja
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Da Janela Do Meu Quarto
Tudo ocorre quando não se espera
E aí sim nossa mente opera
E aí sim a gente aprende
Veja, como tudo está mudado
Já não há tanta distância
Nem enxergo tanta discrepância
Com você aqui ao meu lado
Enquanto todos seguem voando
Eu espero que o tempo pare
E que a minha ferida não sare
E na verdade, sigo esperando
Só espero não te ver fugindo
Como se fosse a única saída
Como se estivesse dividida
Como se nós estivéssemos caindo
Sumindo...
domingo, 10 de outubro de 2010
Fumaça
Anunciado em sua fronte
Desejo seco, quase medo
Sua fonte.
Há no homem um valor
Que não é de fato nada
O ódio a sua dor
Tão amada.
Há no homem outro alguém
Que nem sei se existe
Que atua também:
Só assiste.
Há no homem o que não há
E o que há já foi
Vivemos pra nos libertar
Depois.
sábado, 9 de outubro de 2010
Sofrimento
uma pedra de sal.
Ficou o espírito, mais livre
que o corpo.
A música, muito além
do instrumento.
Da alavanca,
sua razão de ser: o impulso.
Ficou o selo, o remate
da obra.
A luz que sobrevive à estrela
e é sua coroa.
O maravilhoso. O imortal.
O que se perdeu foi pouco.
Mas era o que eu mais amava. "
Henriqueta Lisboa
Equinócio
Cecília Meireles
Aprendi a gostar das Primaveras,
a esperar-te na porta, sem nem ao menos saber se um dia de fato voltarias.
Aprendi também a temer os Invernos,
que sempre vêm destruir tudo o que eu havia plantado,e guardado pra te dar.
Aprendi que as Primaveras nem sempre vêm,
mas quando estão aqui são suficientes pra me resgatar de um insensato desejo
Aprendi que os Invernos as vezes não acabam,
prendem-se a mim e vão congelando cada parte do meu corpo, até mesmo meu pobre coração
Aprendi que a Primavera me da coragem
e só pede em troca que eu de fato a use
Enquanto o Inverno me da apenas angústia
Solidão e alguma inspiração pra que me mascare, ou não
Aprendi que posso ser bem mais feliz vivendo a Primavera do que esperando o Inverno acabar.
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
E Se
Cecília Meireles
------
E se for só saudade?
Não passar de uma lembrança?
Se for apenas por maldade
Ou quem sabe insegurança?
E se tudo se repetir?
Se for só um modo de fugir?
E se for tudo mentira?
Quem sabe a vida interfira?
Mas e se for tudo verdade?
E se tudo, enfim, der certo?
E se não for só momento?
Se os dois tem as mesmas vontades
E podem enfim ficar por perto
Porque apagar o sentimento?
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Insolitude
Solitude é nó
Insólito só
A plenitude e o não
Sois sóis lá onde não há
Qualquer outra razão
Qualquer outro a lutar
Por pura interpretação
O mundo é seu campo de batalha
Onde se luta sem poder errar
É você dentro da falha
Que é o próprio verbo pensar
Sois insolúveis verdades
Sois insensatez e só
Só...
Vestígios de estrada e pó
Tantas certezas incertas
Plenitude nas vontades
Tantas duvidas encobertas
Solitudes, só vaidades
Sois saudades
De tempos não passados
De dias não chegados
De outras e outras grades
Plena In Solidão
Solitude é nó
Insólito só
A plenitude e o não
Sois sóis e apenas
Razões que o tempo mude
Sois vozes e cenas
Sois plena Insolitude
----
Aguarde-nos
domingo, 3 de outubro de 2010
Motivo
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste,
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
Não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
mais nada."
Cecília Meireles
sábado, 2 de outubro de 2010
A Valsa de Esmeralda
Por que bailas, triste assim?
Qual falta grita em sua alma
Que soa em cordas de bandolim?
Esmeralda, segue a dança
Segue o som, caminho seu
Só seguindo se alcança
O que a muito se perdeu
Quem sabe a liberdade falsa?
Quem sabe um motivo qualquer?
Quem sabe por que a valsa
É tudo aquilo que se quer?
Segue o passo, Esmeralda
Siga e passe sem olhar
Que o povo assim te aplauda
Apenas por te ver passar
Segue a trilha, segue o rumo
Siga o vento que soprar
E assim que for eu sumo
Sempre a te procurar.
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
O Dia Dos Olhos
Nada roubava-lhe a atenção, nada tirava-lhe os olhos de outros olhos. Nenhum olhar era incomum. Nem mesmo as cores tinham brilho através daquela nuvem que saia devagar da sua boca. Nada. Nada. Nada... Até aquele olhar passar. Ele acordou, de um longo sono que era a sua introspecção. Precisava encontrar aqueles olhos. Uma rápida passada de olhos no ambiente. Ali estava, aquele par de olhos penetrantes, que o liam como se ele fosse um grande livro aberto, que o devoravam, sim, essa era a palavra, devoravam, como se esfinges. Era preciso desvendá-los, era preciso conhecê-los, descobrir o que guardavam por trás de tanto brilho, tanta cor.
Um leve toque em seu ombro e a fumaça se desfez, como um passe de mágica, era o garçom que lhe perguntava "mais uma dose?", "Por que não?" ele respondeu. O cigarro se apagara e agora não passava de uma pilha de cinzas, mortas. Seu sonho se desfez como uma dose de uísque chegando ao fim - deixando aquele gosto na boca, aquela vontade de mais - e os olhos sumiram como um cigarro no vento, em meio a toda a fumaça, se destruindo devagar.
terça-feira, 28 de setembro de 2010
To The Other Side
Eu sou o que você não vê,
Mas sou o que tens guardado,
O que você carrega na mão.
Eu sou tudo o que não há em você,
Que perfeitamente me foi dado,
Para te completar, te dar razão
Eu sou inexistente aqui,
Mas alí sou um qualquer
E em outro lugar posso só ser
Sou o nó bem dentro de ti
Que só abre quando quer
E que te amarra ao viver.
Eu sou o que divide o seu dia
Sou a noite, cada noite escura
E te assusto em cada madrugada
Sou a sua prece por companhia
E o seu flerte com a loucura
Sou o vulto na sua caminhada
Eu estou e não vou estar parado
Me movendo sem sair do lugar marcado
Observe enquanto não sou notado
Eu sou o outro lado, o outro lado
Trecho em itálico da música "Break On Through" do Doors
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Impasso
No que tenho a lhe dizer
Não sei vais ouvir
Mas não vou mais repetir
Não há mais o que perder
Nem mais erros pra temer
Não é preciso mais fugir
E muito menos fingir...
Não há certo ou errado
E nem o meio o termo, também
Só o que podemos ver
Sei que andei alterado
Mas se queres me ver bem
Fique aqui e não tente me entender
domingo, 26 de setembro de 2010
Sua Mão
Enquanto vagas lentamente
Sozinha pela rua.
Sei que sofres, sei que chora
Sei que sentes, certamente
Mas não queres ir embora.
Não há vento, não há luz
Enquanto a noite segue quente
Só o que sua mão conduz.
Enquanto passa distraída
Com seu riso inocente
O mundo gira, sem saída
E ainda assim quando ela quer
Traz seu mundo levemente
Uma alegria que tiver.
Traz consigo de repente
Algum tesouro, algum qualquer
Que faça tudo ir em frente.
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Tanto Nada
E o que ficou já não passa mais
Tanta coisa mudou
E o que restou me tira a paz
O tanto que desperdiçamos
Já é quase irrecuperável
O tanto que nos machucamos
Chega a ser incontável
O que pra nós já foi um tanto
Hoje é um tanto de dor
O que pra nós foi encanto
Hoje é só o fim do amor
terça-feira, 21 de setembro de 2010
Cansaço
De ter demais ou nunca ter
De ser demais ou parecer
De ver demais e nunca crer
Saber demais pra não viver
Só estou cansado...
De ter tudo esquematizado
De ser assim tão calculado
De ver o que quero apagado
Saber como serei lembrado
Só estou cansado...
Já foi mais do que bastante
E não sei mais se é importante
Se quero sempre ou um instante
Se sou assim ou inconstante
Só estou cansado...
Já foi mais do que devia
E não sei por onde eu ia
Se quero ser o que fingia
Se sou tudo o que eu sentia
Só estou cansado
Por hoje e por amanhã
Por você e por mim
De recomeço e fim
De amor certo e razão vã
Só estou cansado
Cansado demais
Demais...
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
Sete
Uma delas pediu pra que ele contasse aquela história, que ele guardava dentro de si e materializada em todos os traços de sua vida, desde as incontáveis palavras escritas até a aparência cansada e os olhos tristes. "É uma história complicada" disse, "Acho que nem eu mesmo entendo muito bem". De fato, ele ainda não conseguia compreender como tudo aconteceu e terminou tão subitamente, a única coisa que sabia era que estava errado, mas ainda assim resolveu contar. Detalhe por detalhe, ele descreveu aquela tragédia mitológica, o Eros e Psique da sua época, talvez de toda a sua existência. Tentou não deixar nada passar e ainda assim, quando acabou, percebeu que não dissera várias coisas importantes, não sabia se por opção ou se fora apenas deslizes da memória conturbada daqueles dias.
O fato é que contou. Ou melhor, exteriorizou tudo o que sentia, tudo o que sentiu, tudo o que pensou. Seus sentimentos e palavras eram tão densos que pareciam ser palpáveis no ar, pareciam estagnar no ambiente drenando aos poucos a sutil alegria do momento entre amigos."É isso, eu acho", disse meio sem saber se iria querer continuar, caso houvessem mais coisas para serem ditas, "Eu fui idiota, desperdicei um dos meus mais brandos caminhos à felicidade e matei dentro de mim, aos poucos, uma das únicas pessoas que me amou de verdade"
"Não se culpe sozinho", uma delas falou pegando-o de surpresa, "posso não saber como as coisas aconteceram em sua essência e nem ter participado de nenhum desses momentos perto de vocês, mas o pouco que te conheço mostra que você mudou, seu crescimento é visível, mas tardio, tente aceitar e dê o próximo passo: crescer por você e por ninguém mais."
Crescer por mim, por outro alguém... jamais.
Silenciando
Albert Camus
domingo, 19 de setembro de 2010
Certeza
Simone de Beauvoir
sábado, 18 de setembro de 2010
Dez Minutos Sem Razão
E tantas duvidas me esgotam
São tantos os versos que me sobram
E tanta dor que aqui me sobrevoa
A tristeza me consome tanto
Que me vejo preso a tudo seu
A tantas cartas que você me deu
Acorrentado a seu encanto
Já nem caibo mais em meus sonetos
Já nem sirvo mais pra outra vida
E já nem sei contar mais sobre mim
Vago a noite em vários leitos
Procuro algo que me divida
Para que não escreva mais assim
Bons Amigos
Porque amigo não se pede, não se compra, nem se vende.
Amigo a gente sente!
Benditos os que sofrem por amigos, os que falam com o olhar.
Porque amigo não se cala, não questiona, nem se rende.
Amigo a gente entende!
Benditos os que guardam amigos, os que entregam o ombro pra chorar.
Porque amigo sofre e chora.
Amigo não tem hora pra consolar!
Benditos sejam os amigos que acreditam na tua verdade ou te apontam a realidade.
Porque amigo é a direção.
Amigo é a base quando falta o chão!
Benditos sejam todos os amigos de raízes, verdadeiros.
Porque amigos são herdeiros da real sagacidade.
Ter amigos é a melhor cumplicidade!
Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho,
Há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!"
Machado de Assis
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
Poesia Rima Com Nostalgia Pt. 8
Tão simbólico e marcante
E eu preso em passados, sem fim
E por fim sigo adiante
Agosto foi importante
Mudanças de vida, de gente
E já não sigo vacilante
Sei o que me espera a frente
Sei que já não dependes de mim
Enquanto todos dependem de ti
De sua independente paixão
E de ter perto, te ter aqui
Eu guardo o que cabe em meus braços
Coleciono estrago e desaponto
Vivo assim, cada dia um dia
E vou tropeçando em cada encontro
Divago em liberdade
Me envolvo em minha mente
Vejo o que voa livre, longe
E volta de repente
Acordo em sonhos invisíveis
E vejo a passar, levemente
Afogada no medo de não ser notada
Tão diferente, tão inocente
E quando acordo nada espero
Dos outros só solidão
O silêncio em conjunto
Me contento com seu não
E escolhi seguir o fácil
Aceitar como meu destino
Depender de qualquer sorte
Viver a vida num cassino
Mas me pego na tristeza
De ver que machuco seu coração
Ver que sou só motivo
E não mais uma solução
E ainda sigo sendo como posso
Vendo quem vem, quem vai
Visando um topo qualquer
Um céu só meu, que não cai
Vejo um reflexo desconexo
Uma obsessão ou uma cura?
Muito além de bem e mal
Uma cativante loucura
Me jogo por várias esquinas
Apenas pra te procurar
Meus cigarros não saciam
Na caminhada por todo bar
Sabe, reescrevi nossa história
Da forma com que pude ver
Reescrevi como enxergava
Um novo Eros e Psique
Pintei uma amiga em palavras
Pra me deixar um pouco de lado
Tentei escapar da minha mente
E assim ver que estou mudado
Até fiz penúltimas notas
Endeusando o imperfeito
E que nesse vil momento
Eu guardo como um defeito
E tanto mês passou assim
Simbolismo tão marcante
E eu parei no passado sem fim
E tudo em volta vai adiante
Em agosto, eu tolerante
Vi mudanças... vida e gente
E vejo um mundo vacilante
Não espero, sigo em frente
terça-feira, 14 de setembro de 2010
Esfinge
Também um passado de borrões que não tem fim
Tudo assim manchado de ilusões a muito mortas
E algum recado de expressões em linhas tortas
É tudo passageiro e passa rápido
É tudo um jogo onde o dado rola ávido
É tudo tão ligeiro que nem se vê
E ainda arde em fogo se você crê
E tudo isso dentro da minha mente
É um grande enigma, junte as peças
Se julgas importante ao menos tente
Ou me veja batendo aqui, nas mesmas teclas
Se enxergas no meu rosto quem realmente sou
Enxergues em um todo o que esse rosto se tornou
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Teia
E as minhas digitais pelas paredes
Sobram aqui suas contradições
E minhas certezas emaranhadas, feito redes
Nas minhas gavetas seus versos
Os meus estampam cada parte do meu ser
E na minha cabeça repleta de universos
Vejo o seu distante... Como queria o ter
Eu te bebo, te devoro, te consumo sem cessar
Te escrevo, te exploro e me assumo a desejar
E ainda assim não me vejo livre de ti
Eu te vejo, por ti choro, não durmo pra não sonhar
E já não creio que imploro, sumo pra não te encontrar
E ainda assim te sinto e vejo onde quer que possa ir
sábado, 11 de setembro de 2010
(Não) há saída
You come on just like special K
Just like I swallowed half my stash
I never ever want to crash
No hesitation, no delay
You come on just like special K
Now you're back with dope demand
I'm on sinking sand"
Me curei de todos os meus vícios, menos um
Me curei de tudo que me faz mal, quase tudo
Me curei de todos os erros comuns, menos um
Me curei de tudo o que sentia sem querer, quase tudo
E assim eu vou levando
Triste e melhorando
Rindo e me drogando
Com tudo o que você (não) me da
E quando um dia eu tiver sorte
Ou então quando você se importe
Ou quando vier a própria morte
Tudo isso vai passar...
Ou não
"Gravity
No escaping, gravity
Gravity
No escaping... Not for free
I fall down... Hit the ground
Make a heavy sound
Every time you seem to come around"
Trechos em itálico da música "Special K" do Placebo
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
Insônia
Dia após dia...
Me consumindo, desgastando,
Crescente agonia,
A insônia vai me trabalhando,
Fazendo de mim o que queria
Me partindo, me moldando,
Entrando na poesia.
Me alterando
Segundo sua vontade
Me traduzindo
Nas noites em claro
Me recriando
Com requintada crueldade
Me destruindo
Com um toque raro
A insônia me transformou
Em tudo isso que hoje sou
E mudou também o que passou
E o que ainda vai passar
Se é que irá chegar
Um novo dia pra recomeçar
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
Medo
De toda luz tremulante que atravessa sem dó nenhum a minha sombra
De todas as palavras sinceras que cortaram devagar o que eu silenciava
De toda cruz que era um peso agradável e que ainda assim me assombra
De toda mão que estendida tentou me levantar do poço ao qual eu me agarrava
E ainda resta o medo
De continuar sentindo
O que senti tão cedo
Ir devagar me partindo
De ficar sozinho
Só a sua ausência
Com tão pouco caminho
Matando sua inocência
E ainda resta o medo de ficar sozinho
Só a sua ausência continuar sentindo
E o que senti tão cedo, tão pouco caminho
Matando sua inocência, devagar me partindo
Me resta a sombra
E tudo o que assombra
Palavra silenciada
Tristeza reforçada
Te resta a luz
Não há mais cruz
Palavra sincera
O que eu não era
E eu em minha sombra te vejo passar em luz
E tudo o que me assombra eu carrego como cruz
As tuas palavras tão sinceras, silenciadas
E o que eu não era... uma tristeza forjada
terça-feira, 7 de setembro de 2010
Névoa
De olhos profundos e cara fechada
Saiba que estou sonhando
E quando em sonho me encontrares
Sorridente, respirando outros ares
Saberás no que estou pensando?
Vez ou outra irei despertar
Esperando você me encontrar
Apenas te idealizando
E se me deixares na solidão
Volto aos sonhos, a ilusão
De lhe ter me procurando
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
Dia Quente
Estava ele, sozinho em um bar qualquer. Aquela dose de whisky não duraria muito em suas mãos, mas ele logo pediria outra. Enquanto isso todas as janelas pareciam lhe observar. Todo o mundo parecia parado ao seu redor, nem o vento soprava.
Te ver passar já foi uma alegria
Te ver era a base de um doentio dia a dia
E agora olha só como estamos...
Você já foi motivo pra muitas escolhas
Você já foi poesia pra tantas e tantas folhas
E olha só como nós ficamos...
Agora só me resta sonhar ou então quem sabe
Tentar afogar todas as minhas mágoas e tudo o que não cabe
Mais em mim... Rezar pra que tudo isso acabe
E talvez assim poder aceitar um fim.
Ou então um melhor destino pros dois
Quem sabe tudo se ajeita depois
Quem sabe um pouco mais tarde, pois
Ter paciência é inerente a mim
Mas só pra você e ninguém mais...
Enfim, lembre de tempos atrás
E quando um pro outro era paz
Claro, já não sou o mesmo rapaz
Me entreguei a um mundo voraz
E agora sei, que só você traz
Tudo o que eu espero pra mim
Tudo que eu espero de alguém
Tudo o que eu sei sobre bem
Tudo que eu quero pro fim
Pensa!
Mas não adianta só pensar.
Você também tem que dizer!
Diz! Porque as palavras têm poder.
Mas não adianta só dizer.
Você também tem que fazer!
Faz! Porque você só vai saber se o final vai ser feliz depois que tudo acontecer."
Gabriel Pensador
sábado, 4 de setembro de 2010
Mandolin
Como se o foco de um desses dramas
E a cena sobre um grande palco em chamas
A desabar, como tudo que é natural
Havia no casal um ele
Que não dançava conforme a dança
Não é companhia que se aconselhe
Mas que sabia criar esperança
Havia também a outra parte
Ela que só sabia dançar
Que via a vida quase como arte
E que aguardava ansiosa seu par
Um encontro e os dois ao chão
Talvez fosse só ocasião...
Nada demais, sem razão
Ou opção? Será que não?
Pra eles havia uma última valsa
Talvez um réquiem de um belo futuro
Ou um princípio bastante inseguro
Ou só uma vontade falsa
E os dias iam só passando
E os dois lados se encontrando
E passo a passo se juntando
Desconversando, se enganando
E um destino se formando
Entrelaçando e separando
Algo que nunca foi um só
terça-feira, 31 de agosto de 2010
Antífona
De luares, de neves, de neblinas!
Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
Incensos dos turíbulos das aras
Formas do Amor, constelarmante puras,
De Virgens e de Santas vaporosas...
Brilhos errantes, mádidas frescuras
E dolências de lírios e de rosas ...
Indefiníveis músicas supremas,
Harmonias da Cor e do Perfume...
Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...
Visões, salmos e cânticos serenos,
Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
Dormências de volúpicos venenos
Sutis e suaves, mórbidos, radiantes...
Infinitos espíritos dispersos,
Inefáveis, edênicos, aéreos,
Fecundai o Mistério destes versos
Com a chama ideal de todos os mistérios.
Do Sonho as mais azuis diafaneidades
Que fuljam, que na Estrofe se levantem
E as emoções, todas as castidades
Da alma do Verso, pelos versos cantem.
Que o pólen de ouro dos mais finos astros
Fecunde e inflame a rima clara e ardente...
Que brilhe a correção dos alabastros
Sonoramente, luminosamente.
Forças originais, essência, graça
De carnes de mulher, delicadezas...
Todo esse eflúvio que por ondas passa
Do Éter nas róseas e áureas correntezas...
Cristais diluídos de clarões alacres,
Desejos, vibrações, ânsias, alentos
Fulvas vitórias, triunfamentos acres,
Os mais estranhos estremecimentos...
Flores negras do tédio e flores vagas
De amores vãos, tantálicos, doentios...
Fundas vermelhidões de velhas chagas
Em sangue, abertas, escorrendo em rios...
Tudo! vivo e nervoso e quente e forte,
Nos turbilhões quiméricos do Sonho,
Passe, cantando, ante o perfil medonho
E o tropel cabalístico da Morte..."
Cruz e Souza
Penúltimas Notas
As nuvens parecem não se mover
O Sol não quer descer, a Lua não vai nascer
As palavras, as pessoas, desabam.
Sentado em meu abismo virtual
Eu me repito em cada ritual
E é tão igual, até o que se muda
Essa constante necessidade de ajuda
Essa busca pela imperfeição
Pelo humano racional sem razão
Pelo sentimento essencial
Que não é da essência real
Já me levou longe demais
Por enquanto quero paz
Distancia dessa maré de eus
Que transbordam de mim
Distancia de espectros seus
De tudo que não me pertence enfim
De tudo que foi, tudo o que era
De tantas vidas vistas pela janela
E ainda assim buscar por ela
Aguentar toda essa espera
Porque o que há de imperfeito
Me basta por um momento
E o que guardo como defeito
Talvez seja só alimento
Pra uma chance de mudança
Alguma sutil e suja esperança
domingo, 29 de agosto de 2010
É... Morena
Digas, se sabe morena...
Sei. Sei que algumas pessoas de alma tão pequena,
Já lhe golpearam o coração
E ainda assim com alma plena
Usa tanto de tua razão
Mas diga-me se puder, morena
O que há de errado com esses tolos
Que teimam em lhe destratar?
Tantos foram... já nem contas
E de você restaram pontas
Pedaços pra se concertar
O que há de errado com eles?
Será um mau jeito pra se amar?
Será que já não sabemos nada
Ou tudo que era já não vale?
Se souberes, por favor, me fale
Se é que há resposta tão caçada
Já nem sei por onde ir
Nem espero que me sigas
Só que enfim consigas
Alguém que te mereça realmente
Que lhe tome com vontade, amor ardente
Ou que só te faça sorrir
Despertar é Preciso
Na segunda noite, Já não se escondem; pisam as flores, matam o nosso cão, e não dizemos nada.
Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, Já não podemos dizer nada."
Vladimir Maiakóvski
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
O Cego, Surdo e Vivo
Era um dia comum. Era cinza, como todos os dias naquela bela cidade. Chovia... Algo próximo de uma garoa bem fina, como sempre. Todos passavam sem reparar em quem ficava para trás. Na verdade todos passavam sem reparar em nada. Uma constante meditação que consistia na simples tarefa de olhar para a ponta do próprio nariz e assim esquecer todo o mundo a sua volta, mas é claro, sem a parte de olhar para a ponta do nariz.
Dentro do meu mundo solitário eu observava o caos da rua em frente. Essa triste pintura que surgia na minha janela. Não sei se as janelas estavam sujas, mas o céu estava cinza, assim como tudo lá fora. O vapor do meu café embaçava meus óculo, talvez isso tenha mudado um pouco as cores do mundo lá fora, mas o importante não é nada disso. Enclausurado nessas grades que são meus pensamentos relia tudo o que já havia sido escrito pra ela.
"Por que será que é sempre igual?
O homem espera o fim pra tentar entender o princípio... Espera tudo dar errado para começar a considerar que errou... Espera não ter chances para começar a tentar.
E ainda assim quando tudo dá errado, nossa primeira atitude é contar pra todos a nossa volta todos os detalhes sobre tudo o que aconteceu. Será que existe alguma necessidade de explicar aos outros sobre sua vida? Não, o homem conta passo a passo todos os seus erros para enfim tentar entender onde errou. Ninguém fala sobre seus problemas para os outros, o outro nessa situação é apenas um espelho, um retorno... um modo de escutar o que você nunca quis ouvir, de enxergar o que nunca quis ver...
De sentir o que você nem ao menos se preocupou em entender"
As pessoas me perguntam por que escrevo tantos desabafos.
Isso é apenas um modo de organizar as minhas idéias pra ver se me convenço sobre o que eu já cansei de convencer os outros.
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
Meu Eros e Psique
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Havia a muito um rapaz
Jovem, porém vivido
Falante e tal qual contido
Muito, muito tempo atrás
Havia também outra metade
Dama, rainha de suas ilusões
Chama, ardia em seus corações
Não pede lugar... Invade.
Eros e sua psique
Entre eles um mundo
Um instante, um segundo
Um abismo... Um porquê
Dizia um Eros alterado
“Queria ser como tu és
E poder enfim mover meus pés
E assim te deixar de lado”
“Queria ainda te querer
Ter um desejo sincero
Ou ter lhe um pouco como quero”
Chorava, sua Psique
Sofria Eros, amargurado
“Veja como lhe amo
Ouça o quanto lhe chamo
Sinta como tenho mudado”
“Será que isso já não basta?
Esse amor descontrolado
Um vício tão desenfreado
Essa paixão tão vasta?”
“Verá-me sofrer sem fazer nada?
Entrego-me e você se esconde
E ainda assim não me responde
Sobre essa dor tão impensada”
Psique se desespera
“Eros... Pense em mim agora
E não vá embora, como outrora
Fostes, deixando-me na primavera”
Mas Eros não pensa só nela
E sim na tristeza que sentia
E no mundo lá fora, suposta alegria
Foi embora, deixando sua bela
Eros e Psique
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia. "
Fernando Pessoa
domingo, 22 de agosto de 2010
Eu...
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"
Florbela Espanca
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
Café, Cigarros e Tristezas
Por essas ruas já cansei de andar
E me cansei de sentar
Em todo e qualquer bar
Apenas pra te esperar...
Não sei mais que horas são
E nem pra onde as pessoas vão
E só eu sei qual é a razão
Dessa insensata solidão...
E eu ainda te vejo em cada esquina
Em cada espelho eu te desejo
Em cada cigarro eu te devoro
E eu ainda seguro cada ruína
E a cada instante és tu que vejo
E é por ti que aqui imploro...
quinta-feira, 19 de agosto de 2010
Conversas de Bar
Estávamos sentados, naquela mesa de sempre.
Fato no mínimo estranho pra mim - voltar a conviver com um grande amigo do passado que se revelou um grande amigo de hoje - e a conversa fluía como nos tempos passados. Costumávamos conversar sobre tantas coisas... Política, música, livros, teatro, sociedade... vida, principalmente a vida.
Devo admitir que nunca fui muito interessado nos rituais habituais de cada pessoa a minha volta, mas sempre me agradou a perspectiva de saber um pouco da vida de cada um. E ali estava ele, falando sobre tantas questões musicais que permeiam nossas vidas, quando um comentário escapou de minha boca:
_ Ando tão desiludido com música...
Desilusão é uma palavra usada frequentemente nas nossas conversas.
_ Cara... desilusão com música não existe, é tudo temporário, não se detenha por isso. Eu, porém, ando tão desiludido com as pessoas. Costumava ter tantos amigos e parece que só assisti o processo de afastamento de cada um, tudo mudou tão repentinamente...
_ Olha só, o mesmo aconteceu comigo, talvez em escalas maiores e de uma forma mais dolorosa. As vezes penso que ainda nem acabou. Acho que ainda não existe um remédio pra mudanças súbitas, mas se existisse as pessoas se matariam motivadas pelo tédio de tamanha monotonia.
_ Mas eu passei todo o meu ano passado com essas pessoas e elas se afastaram apenas por considerar que eu estava mais próximo de colegas da faculdade
_ O que posso lhe dizer é que devemos nos acostumar com essa grande estação de trem que é nossa vida. Tantos vão e tantos vem e um dia você irá também.
Brinde.
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
Retrato
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?"
Cecília Meireles
terça-feira, 17 de agosto de 2010
Convexando
Tudo soa tão igual
Razão... cativante loucura,
Muito além de bem ou mal
Se através de algum reflexo
Enxergo um eu tão desconexo
Será só eu que estou errado?
Se o meu espelho no seu olho
É tudo o que eu não escolho
Será que o mundo tem girado?
Só solidão? Amargura?
Ou o mundo perdeu seu sal?
Teu coração já não me jura
Mente... meu inferno astral
Sons, sem alma, em anexo
Tua voz, minha falta de nexo
Sem jeito e sem lado
E agora nem planto... só colho
Diante de teus olhos eu encolho
Ninguém pra ver se tenho mudado...
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
Participo Sendo
E vou sendo como posso,
Jogando meu corpo no mundo,
Andando por todos os cantos
E pela lei natural dos encontros
Eu deixo e recebo um tanto"
E cada passo marcado por pranto
Resulta depois em algum canto
A tristeza de um tempo, de um tanto
Nos passa como um tempo santo
E permaço sendo o que posso
Desprezando qualquer mundo nosso
Cada fato amargo, eu adoço
Lembrando de algum sorriso vosso
E essa lei natural dos encontros
Marcada por tantos desencontros
Por tanta gente que vem e vai
E eu ainda movo o meu corpo
Visando um alto, algum topo
Um céu só meu, que não cai
Trecho em itálico da música "Mistério do Planeta" dos Novos Baianos
domingo, 15 de agosto de 2010
Na eternidade de um instante
E ninguém quer ficar parado
Mas um ser tão inconstante
Vai sendo aos poucos apagado
Ainda ouço a tua voz
Fantasiada em sutilezas
E ainda assim me privo
Por imensas incertezas
Ainda sinto tua presença
Rodeando a minha mesa
E ainda assim me privo
Dessa gigante beleza
Ainda penso no teu tempo
Em como tinhas razão
E ainda assim me privo
Me entrego a solidão
Ainda escrevo teu nome
Sem dar muita atenção
E ainda assim me privo
De tudo que remete a paixão
Arrisque
Apague a incerteza
Acorde o seu inativo
Porém grande, coração
Pra mim um uísque
Pra esquecer a frieza
Esquecer do que me privo
E me joga ao chão
Triste
É ver a tua tristeza
E ver que sou motivo
E não mais solução
Último Soneto
Nos lábios meus o alento desfalece,
Surda agonia o coração fenece,
E devora meu ser mortal desgosto!
Do leito, embalde num macio encosto,
Tento o sono reter!... Já esmorece
O corpo exausto que o repouso esquece...
Eis o estado em que a mágoa me tem posto!
O adeus, o teu adeus, minha saudade,
Fazem que insano do viver me prive
E tenha os olhos meus na escuridade.
Dá-me a esperança com que o ser mantive!
Volve ao amante os olhos, por piedade,
Olhos por quem viveu quem já não vive!"
Álvares de Azevedo
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Poesia Rima Com Nostalgia Pt. 7
E todos passam por mim
Aqui não há relógios
E nada parece ter fim
Julho... Divisor de tempos
Horas passam devagar
Mais compassos solucionados
Tudo pode enfim melhorar
Minha crueldade vulgar
Nos levou até o fim
É triste pra você
Mas as coisas são assim
Recobrei a consciência
Criei intento
Agreguei vontades
E chegou o momento
Agora sente-se, sinta-me
Veja os muros da paz
A sensação, senso, ação
Os mundos dos demais
E agora lembre-me
De tentar esquecer
De ser assim
Ou ao menos tentar ser
Veio fácil, foi embora
E agora, será que algo restou?
Engraçado a princípio
E veja agora onde estou
Mate-me, pelo menos isso
Não acabe com a confiança
Não me torture
Não tire a esperança
Lembre-se de como eu fui
Mesmo que por pouco
Velhos pros anos que consomem
Talvez apenas um louco
E eu me pergunto sempre
Qual o motivo, a razão?
E quando estava caído
Fostes chute ou mão?
Ou então, bem melhor
De onde veio tanto azar?
Nunca entendi como é
Essa tendência a piorar
O mundo passa na janela
E eu de longe, na moldura
No esquife, preso, cinza
Não diferencio o real da pintura
Aqui de sorriso morto
De face dura e gasta
Pra mim não há palavra
Pra ti só ela não basta
Não há exemplo em nada
A peça se dissolveu
Minha existência ocorre
O Mundo desapareceu
E ainda assim compartilhamos
A mesma vontade, violência
Presos na mesma tempestade
E sofrendo pela mesma essência
É preciso coragem
De seguir em frente
Não adianta só querer
Preciso enfim ser diferente
O tempo vai parando aos poucos
E os tempos já não tem fim
Aqui não há pressa
E nada sobra em mim
Julho... morto por tempos
Horas tendem a passar
Mais compassos mal contados
Tudo pode enfim desandar.
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Giz
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Recordando
Vivem a mutuar, agora, estreme agrado
Quando o olhar fome tem de ver algum semblante
Ou o coração a arder de amor se afoga ansiado
Do meu amor na bela efígie o olhar refaz-se
Da fome, e o coração com ele se banqueteia
Do coração também conviva é o olhar e, em face
Um do outro, tem os dois sonhos que o amor ateia
Ambos, assim, por meu amor, por teu retrato
Embora estejas longe, a mim te põem presente
Porque o meu pensamento, aonde fores, de fato
Irá, é porque estou nele e ele está em ti permanentemente
Se ele dorme, a tua efígie o coração me alerta
Para o gozo cordial e visual que desperta"
William Shakespeare, Sonetos
Motivo(ação)
Como parte do destino
Azar e sorte, um cassino.
Mudar, isso sim é jogar
Tristezas vem e vão
E há alegrias que não vem
Para causar algum bem
E assim passam em vão
Bem pior do que a mudança
É a contínua insegurança
De quem fica a esperar
Bem pior do que a morte
Talvez só depender da sorte
Para enfim se melhorar
terça-feira, 10 de agosto de 2010
Longe de Ti
Nessas horas de largos instantes,
O ponteiro, que passa os quadrantes,
Marca séculos, se esquece de andar.
Fito o céu — é uma nave sem lâmpada.
Fito a terra — é uma várzea sem flores.
O universo é um abismo de dores,
Se a madona não brilha no altar.
Então lembro os momentos passados.
Lembro então tuas frases queridas,
Como o infante que as pedras luzidas
Uma a uma desfia na mão.
Como a virgem que as jóias de noiva
Conta alegre a sorrir de alegria,
Conto os risos que deste-me um dia
E que eu guardo no meu coração.
Lembro ainda o lugar onde estavas...
Teu cabelo, teu rir, teu vestido...
De teu lábio o fulgor incendido...
Destas mãos a beleza ideal...
Lembro ainda em teus olhos, querida,
Este olhar de tão lânguido raios,
Este olhar que me mata em desmaios
Doce, terno, amoroso, fatal!...
Quando a estrela serena da noite
Vem banhar minha fonte saudosa,
Julgo ver nessa luz misteriosa,
Doce amiga, um carinho dos teus!
E ao silêncio da noite que anseia
De volúpia, de anelos, de vida.
Eu confio o teu nome, querida,
Para as brisas levarem-no aos céus.
De ti longe minh’alma vegeta,
Vive só de saudade e lembrança,
Respirando a suave esperança
De viver como escravo a teus pés,
De sonhar teus menores desejos,
De velar em teus sonhos dourados,
"Mais humilde que os servos curvados!
Inda mais orgulhoso que os reis"!
Ó meu Deus! Manda às horas que fujam,
Que deslizem em fio os instantes...
E o ponteiro que passa os quadrantes
Marque a hora em que a posso fitar!
Como Tântalo à sede morria,
Sem achar o conforto preciso...
Morro à míngua, meu Deus, de um sorriso!
Tenho sede, Senhor, de um olhar."
Castro Alves
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
Tédio
Olhos que nada enxergam
Dedos que já não pecam
Sonhos se tornam opacos
Limita-se ao céu escuro
Já não quer mudar nada
Nem empunhar uma espada
Não quer um desejo puro
Dos outros não espera
Nada além da solidão
Do silêncio em conjunto
Com futuros não coopera
Se contenta com o não
E com a falta de assunto
domingo, 8 de agosto de 2010
Aos Que Passam Em Nossas Vidas
Porque cada pessoa é única para nós,
e nenhuma substitui a outra.
Cada um que passa em nossa vida passa sozinho,
mas não vai só...
Levam um pouco de nós mesmos
e nos deixam um pouco de si mesmos.
Há os que levam muito,
mas não há os que não levam nada.
Há os que deixam muito,
mas não há os que não deixam nada.
Esta é a mais bela realidade da vida...
A prova tremenda de que cada um é importante
e que ninguém se aproxima do outro por acaso..."
Antoine de Saint-Exupéry
Sonhos Invisíveis
Lentamente.
Mistificada.
Atraente.
Sutil.
Passava levemente.
Não guardava nada.
Inconseqüente.
Sorriu,
E o mundo de repente
Deu a volta errada.
Indiferente.
Agiu.
Como serpente.
Preparada
Para o bote eminente.
Seguiu.
Passos pra frente.
Sua alma machucada.
Sua pele ardente.
Subiu
O inexistente,
Em sua escada
Incoerente.
Caiu.
No meio da gente,
No meio da estrada,
No meio da corrente.
Fugiu.
Com medo diferente
De nunca ser notada
Inocente.
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
Sombreiro
Escondida dentro de minha
Cabeça se encontra a liberdade
Ela voa livre e sem pressa...
Mas só volta muito tarde
terça-feira, 3 de agosto de 2010
Discreta e Formosíssima Maria
Enquanto estamos vendo a qualquer hora
Em tuas faces a rosada Aurora,
Em teus olhos, e boca o Sol, e o dia:
Enquanto com gentil descortesia
O ar, que fresco Adônis te namora,
Te espalha a rica trança voadora,
Quando vem passear-te pela fria:
Goza, goza da flor da mocidade,
Que o tempo trota a toda ligeireza,
E imprime em toda a flor sua pisada.
Oh, não aguardes, que a madura idade
Te converta em flor, essa beleza
Em terra, em cinza, em pó, em sobra, em nada."
Gregório de Mattos
O Que Couber
De mil dores muito humanas
E de certezas tão insanas
Um estranho em meio a magos
Colecionador de estragos
Trazia dentro das entranhas
Tantas sensações estranhas
Passos, vazios tão largos
De tanto estrago e desaponto
Ele ia passo a passo
Vivia cada dia um dia
De tanto amargo triste encontro
Ele carregava no braço
Tudo o que ele não podia
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Independas
Nem sequer dependes
De um qualquer ruim
E assim, não aprendes
Não dependes de ninguém
E ainda não sabes dizer
Pra que lado pendes, meu bem
Nunca soubestes escolher
Não dependes nem de ti
De ninguém presente aqui
Enquanto todos dependem
De te ver sorrir
E de esperar em vão
Sua independente paixão
quinta-feira, 29 de julho de 2010
O Caco da Outra Coragem (Velho Amanhecer)
Coragem.
Se manifesta por meios estranhos,
Se manifesta em homens estranhos.
Nem sempre basta coragem
Nem tudo se resume a medos
E quando chegar a hora
Veremos tudo fugir...
Entre dedos
Coragem pra outros olhos
Não passa de exibição
Do que vale a coragem,
Se me falta tanto
Pra iniciar a viagem?
Não adianta apenas querer
Seguir em frente e esquecer
Não basta admitir a derrota
E começar a trilhar outra rota
Coragem é lidar com temores
No meu caso, lidar com amores
Coragem é reunir detalhes
Para esquecer mil males
Navegar em outros mares
Sofrer de outras dores
quarta-feira, 28 de julho de 2010
Tanto Amar
Amo tanto e de tanto amar
Acho que ela é bonita
Tem um olho sempre a boiar
E outro que agita
Tem um olho que não está
Meus olhares evita
E outro olho a me arregalar
Sua pepita
A metade do seu olhar
Está chamando pra luta, aflita
E metade quer madrugar
Na bodeguita
Se os seus olhos eu for cantar
Um seu olho me atura
E outro olho vai desmanchar
Toda a pintura
Ela pode rodopiar
E mudar de figura
A paloma do seu mirar
Virar miúra
É na soma do seu olhar
Que eu vou me conhecer inteiro
Se nasci pra enfrentar o mar
Ou faroleiro
Amo tanto e de tanto amar
Acho que ela acredita
Tem um olho a pestanejar
E outro me fita
Suas pernas vão me enroscar
Num balé esquisito
Seus dois olhos vão se encontrar
No infinito
Amo tanto e de tanto amar
Em Manágua temos um chico
Já pensamos em nos casar
Em Porto Rico
Chico Buarque