terça-feira, 27 de outubro de 2020

Espelho

Maldizes o tempo, maldizes, simplório,

A todos aqueles que há tanto partiram,

Maldizes gastando este seu repertório

De fases e crises que mal existiram.


Maldizes a sorte, o destino e a esperança,

E a gente que dança sabendo dançar, 

O presente, o futuro e a lembrança

Dos dias que ainda querias tentar.


Maldizes o amor, conturbado e confuso,

Como quem cai na armadilha por livre vontade,

E então evade, difuso, 

Por versos de sonho e saudade.


Maldizes a tudo, é o que lhe restou,

Só assim justifica essa tua inépcia de perdoar.

Maldizes a tudo, inclusive a ti mesmo,

Pra ver se alguém vem te resgatar.

sábado, 24 de outubro de 2020

Já não somos os mesmos, certamente,

Já não somos os mesmos, certamente,

Hoje carregamos o fardo
Da consciência que emana de nossa responsabilidade sob os atos,
Estas coisas que temos evitado, diariamente,
Nos olhares atravessados por sobre as xícaras,
Em talheres despejados com desajeito incomum,
No súbito silêncio que lhe recepciona em eventos de família,
E o desinteresse porcamente disfarçado em um convite falso
Ao qual esperam que não compareças.
As fraturas vão tomando o vidro do porta-retrato
E as nossas distâncias, agora tão visíveis,
Dispostas bem na mesa de entrada, junto às chaves 
E aos retratos deste passado,
O tempo ao qual rendemos suspiros 
E não foi real.

Quisera acreditar na mesma ilusão que vós,
E não perder a voz, silenciando novamente as verdades
Que ninguém espera ouvir,
Enquanto recebo em meus braços o corpo que hesita,
Por não saber se é sincera a minha entrega,
Se o momento é belo ou só constrangedor.
Ah, mas se fosse sincero, se qualquer coisa em mim fosse sincera,
Senão as palavras que desabam nesses momentos,
Que é que seríamos?
A fagulha prestes a explodir.

Anuviei a vida, me tornei tempestuoso,
Qualquer hora precipito tudo pra fora de mim.

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Senti o frio, o abraço vago que a morte oferecia,

Senti o frio, o abraço vago que a morte oferecia
No horror da noite, vi na sombra do passado
A ilusão do amor jamais vivido antes
Do sonho terno que teu corpo me propõe.

Súbito cessaram as máquinas, a obra poética,
Os planos herdados de apreço e desilusão,
O indulto dos mortos e o ardil dos Deuses,
A vida que tua luz não iluminava e que a mim foi tudo.

Pois o amor, enquanto arte, é um sonho quente,
Como uma valsa que repete noite a noite, 
Mas não aquece e nem renova o coração.

Somente tu é que acende o que não queima,
Só teu beijo recompõe minha vontade,
Só a ti amo, como nunca amei ninguém.