segunda-feira, 1 de março de 2010

O Insone e o Covarde Pt. 5

Último Capítulo - A Insônia e a Covardia

O covarde se levantou da cama após horas perdidas na tentativa de adormecer. Sentia-se fraco. Sentia-se pior do que fraco, aliás, sempre fora fraco. Ele se sentia derrotado. Tinha perdido a guerra contra seu pior inimigo, ele mesmo. Sucumbiu pelo pânico. Ajoelhou-se e pediu misericórdia diante do seu assassino, o tempo. Já não havia volta para ele. Já não havia meios de sair do abismo que ele mesmo criara. Ele estava sozinho e a beira da queda. E caiu.


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O insone acordou com o telefone tocando. Já se passava das 11:00 da manhã! Como estava feliz por ter adormecido por tanto tempo. Se lembrava apenas de ter se cansado após chorar horas a fio. O telefone continuava tocando, mas ele ignorou, quem quer que fosse poderia esperar. Ele devia gritar ao mundo sobre sua alegria de ter dormido toda aquela noite. Sabia o que fazer, visitaria o irmão.

Foi tomar banho e ligou o rádio, que tocava um bocado de músicas que ele não conhecia, há muito não acompanhava o cotidiano. Desligou o chuveiro e se secou. Cantarolava uma música que seu irmão gostava muito..." Ainda é cedo amor... mal começastes a conhecer a vida..." nãnãnã e qualquer coisa. Nuna prestara muita atenção no que o irmão de fato fazia.

Vestiu-se e foi até a sala, ligou a televisão e um repórter falava sobre o congestionamento no centro. Seu irmão podia esperar mais algum tempo, afinal não valia a pena sair agora. Foi até a cozinha preparar um sanduíche e tomar um café. Acendeu um cigarro. Ah, sentia-se vivo novamente, como se não houvesse mais pesos em suas costas. Uma boa noite de sono livra qualquer um dos problemas do dia anterior. Estava errado.

O telefone tocou denovo. Pouco lhe importava, não atenderia ninguém naquele dia especial, nem mesmo seu chefe...talvez só o seu chefe. Lembrou-se do irmão, pensou em ligar e avisar sobre a visita. Não, é melhor ser uma surpresa. Será que seu irmão tinha ficado magoado com a sua atitude na noite passada? Esperava que não.

Passou algum tempo e ele resolveu sair. Entrou no carro e dirigiu por aquele caminho que ainda lhe era estranho. O celular tocou. Algum número desconhecido, não iria atender. Ligou o rádio do carro. Continuou o percurso. Pegou um pouco de transito intenso e pensou que iria se atrasar. O celular tocou mais uma vez, mas ele nem se importou.

Chegou a casa de seu irmão e reparou que havia um número incomum de pessoas naquela rua. Ah, deve ser festa em algum lugar da vizinhança. Tocou a campainha. Ninguém atendeu. Tocou de novo...nada...nada. Nada. Girou a maçaneta, a porta estava aberta. Foi até o quarto onde seu irmão costumava ficar. Vazio. Achou estranho. Onde o covarde poderia ter ido? Pegou o seu celular, iria ligar para o irmão. Não tinha o número, nem mesmo o de casa.

Saiu, voltou para o carro. Sentiu-se mais feliz, afinal seu irmão havia saido de casa após quase quatro meses de prisão domiciliar. O rádio contava sobre um rapaz que fora encontrado morto em uma rua perto dalí. "Isso explica essas pessoas aqui", pensou. O radialista contava que o rapaz havia morrido após usar uma altissima dose de cocaína e ter uma overdose. O celular tocou denovo, dessa vez um número diferente, mas desconhecido também. Resolveu atender podia ser seu irmão.

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O covarde sabia onde ir e o que fazer. Pegou todo o dinheiro que tinha e foi até o velho conhecido, em um bar próximo a rua de sua casa. Lá comprou toda a cocaína que podia e a usou alí mesmo. Sentiu que era capaz de tudo. Sentiu que era um super homem, ou ao menos um homem. Pegou o papel e a caneta que guardava pra ocasiões como esta e escreveu tudo o que queria dizer ao irmão. Sabia que não aguentaria muito mais tempo então não podia demorar. "Aqui estão as respostas" escreveu no verso "Me desculpe".

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O médico disse que seu irmão não havia aguentado a dose tão alta de cocaína e teve uma overdose fulminante. Entregou-lhe o bilhete que ele havia escrito e foi embora. O insone não conseguia falar, nem andar e quase não respirava. Foi pra casa tentar entender o que tinha acontecido com seu irmão.

Leu tudo três vezes e não conseguiu parar de chorar. Sabia que a culpa havia sido sua. Sabia que quem merecia tudo aquilo era ele e não seu irmão. Sabia o que tinha que fazer, embora fosse contra o último pedido do irmão. Escreveu tudo o que queria ter dito ao mundo em papéis manchados e sujos, colocou-os em cima da mesa, junto com tudo o que tinha de valor. Não haveriam mais noites intermináveis, nem medo, nem pânico, só o silêncio. A paz tomaria conta dele, a paz de espírito. Disparou. Mais um corpo caiu no chão aquele dia.

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