Ao Amigo Ernesto Penaforte
Se a vida fosse justa, nós, meros mortais neste templo,
Nem mesmo conceberíamos.
Afinal, que é que podemos saber, amado irmão?
Ao fim da curva, a estrada se estende ao infinito,
E nem mesmo sei quanto deste caminho percorreremos lado a lado.
Paredes erguidas de concreto e sonho,
Uma cidade inteira em que nós dois, a despeito do tempo
e de qualquer responsabilidade]
Inúmeras vezes desbravamos,
Tu contava-me de afeto e ternura,
Eu empilhava os corpos das vítimas de teu charme,
Mas tudo estava bem, os mortos não tem sentimentos
E você tem demais.
Por isso é que digo, a tu somente, meu amigo,
Que se a vida fosse justa, nenhum de nós saberia.
Desenganados novamente pelas expectativas
de sucesso, de holofotes,
de quartos de hotéis destruídos]
E as filas de pessoas a ir e vir
Das quais jamais nos lembraríamos dos nomes,
Apontando ao Penaforte ensandecido
A tirar frascos dos bolsos do paletó,
Transbordando interesses mesquinhos,
Mesquinhos como nós.
Como eu te amo, meu querido amigo, amo a ilusão que criastes
De que eres qualquer coisa além de um patife,
Me faz acreditar, mesmo que por pouco tempo, que há de fato
algo de bom no mundo]
Afinal, onde é que encontraria, em um mundo repleto de patifes
Canalhas amontoados em mesas de bares no centro da cidade,
Um outro patife como vós?
Quisera, porém, compartilhar da fé inabalável,
Vós, o verdadeiro publicitário da cristandade,
Cavaleiro desmontado de uma cruzada inútil,
Pois os Deuses nunca lhe pediram nada...
Ainda assim, tu levantas o estandarte do passado
E vai reler os clássicos em seu tempo livre.
Um nobre vagabundo - se me perguntas - é o que tu és,
Da mais alta estirpe dos calhordas dessa terra,
Enganando a quem quer que saiba ler,
Com essa classe de lorde inglês no verão de dez mil sóis
desta antiga Vila Velha.]
A natureza realmente é admirável.
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