Quisera poder apontar-lhe em um só verso
Inúmeras questões que lhe afligem, pobre alma,
Pontuar, calmo, a série larga destes medos que cultivas
A ponderar, mineiramente, esta ressaca em tua vida
Que lhe acompanha, fielmente, desde outros carnavais,
Mas falta tempo.
Proponho tão somente a certa máxima,
Que tua esquiva prepotência já não poderás fugir,
Ao menos sabes de si mesmo, a ponto de não ter resposta
E, ainda assim, sentar-se a mesa com qualquer que te retruque?
Tu sabes que és o culpado por tua própria decadência,
Então porque dói tanto em ti que seja outro que lhe diga?
Te fizestes herói, detetive, errante, mesmo quando sabias
Das respostas desde o início, alimentando a ficção, recriando
Cenários a troco de nada - quer dizer - a troco de muito tempo,
Permanentemente jogado fora, enquanto tu, ó pobre vítima,
Chafurdava nesta lama, com o gosto pecaminoso da indiferença,
Farta sobremesa ao teu azedume, este desgosto que emulas.
Digo-lhe que erga-te, de que maneira não me importa,
Mas dá-me certa ojeriza ver-te tão largado às traças,
Tu, que outros ainda teimam em defender, sem ter razão,
Tu que despencas, de propósito, sempre do mesmo
Precipício, só por saber que após a queda, a cama
Quente ainda te espera.
Trata de ser forte, que nem mesmo a fantasia
Concebe este teatro, este retrato mal tirado
De tuas velhas intenções, conto antigo, adulterado,
Em que se retira a essência arquetípica proposta,
Pasteurizando toda a trama pra vender uma moral
Que nunca te disse nada, convenhamos.
Pobre herói...
Que preso à sina de salvar qualquer donzela
Se afoga em drama e desvirtua a própria sorte,
Até restar somente o espelho objetivo
Que só reflete eternamente uma questão:
Salvas a ti ou esta que tu mal conheces?