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quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Predador e Presa

No começo fez-se o laço de armadilha simples
Pra quando teus olhos cruzassem os meus.
E assim, tu presa de arcanjo torto,
Vistes dois desastres se anunciarem:
O desgosto e o delírio.

No segundo dia foi o poço, a queda livre,
E nós, enfeitiçados pelo sol a pino,
Já não percebíamos mais a ironia detrás,
E aceitamos o encontro
Como se fosse a única saída.

Em seguida veio a trama de nossos jovens fios,
O emaranhamento de todas as essências,
E logo já não era possível dizer
Onde tu começavas
E onde terminava o eu.

Naturalmente, no clímax dessa história,
Há de caber um certo drama.
O outono acabaria em um inverno seco,
E mesmo em meio a tanto frio
Tu vistes que comigo poderia se queimar.

Depois, em tons de uma falsa sinceridade,
Entramos em uma guerra sem vencedores,
Um refinamento agressivo de nossas vontades:
Tu defendias a emancipação de tua vida
E eu jamais lhe entregaria a chave.

E passaram-se os anos, como costuma ser,
Passou o inverno, a tempestade, a fúria,
E no campo de batalha floresceu 
A certeza de que sem ti
Nada em mim teria acontecido.

É por isso que venho rogar pragas,
Pra que tu entendas que sinto asco
Não de ti, mas de mim mesmo,
Por ser eu quem devo ser culpado
E tu quem deve ser exaltada.

Então faça, faça agora tua denúncia,
Vai lá gritar ao vento do vilão que sou,
Quem mais poderia te ouvir
Senão eu, teu predador,
Resoluto em não te abandonar, minha presa.

terça-feira, 19 de agosto de 2025

Resgate

O resgate não veio
E tu, ao relento desfez-se,
Sem contentamento vê-se
E choras ao vento que passa
Por horas e horas a fio.

Grossas camadas sobre a pele,
As frustrações te endurecem,
As tentações te apetecem, 
E as obsessões todas somadas 
Velam por tua desesperança.

Não resta-lhe muito,
Tens teus meios e limites,
Tens receios e palpites,
E os devaneios pobres
Que nutres em hipóteses vãs.

Quisera erguer-se belo
Em um pedestal edificado,
Ser tu cristal bem lapidado,
E transitar livre entre os planos
Que ainda não projetara. 

O silêncio coroa a distância
Entre tua pessoa e a realidade
E a vida ressoa em maldade
Quando tudo que ouves
Diz nada de ti.

Mas o resgate nunca veio
E tu percebe-se só no boulevard,
Entre seu dó e a força pra mudar,
Em um paletó que não lhe cabe,
Afinal, tua dor expande-se além de ti.

E, já bem tarde, vês que o tempo passa
E tudo tem passado em tua frente,
Tudo tem passado e tem presente,
Mas és tu quem mostrará ao mundo
A novidade que ainda serás.

O futuro reserva a glória e o esquecimento,
Venenos letais que dispõe-se em doses idênticas,
Aguardando apenas teu movimento
De excesso ou ausência,
No mais arriscado dos jogos:

A vida





quarta-feira, 9 de julho de 2025

Ao vale cinza

Sonhei por noites a fio
A meu lado tua sombra,
Inquieta lembrança de tudo aquilo que tu deixastes,
Ecos do que era, desejos reparados
E em nossa frente o coração do mistério
Será que poderíamos - outra vez -
Romper a dúvida e encontrar felicidade?

Quis gritar,
Tremi de noite, por medo e solidão,
Não sei se acreditei, por um momento sequer,
Que era capaz de atravessar a imensidão
Sem tua luz.

Confesso que caí,
Lancei-me ao fundo de todas as sarjetas,
Já não podia erguer-me
De toda essa sujeira.
Dormi na vala e reconheci
Um lugar que era, enfim, só meu

E em um destes inúmeros pesadelos
Ouvi a voz da musa
Que em incisivo golpe
Rechaçou meu sofrimento
Sua dureza em decreto me dizia
Que essa sombra já havia tirado muito de mim

Então, em segunda parte de infortúnio,
Larguei o conforto de meu poço lúgubre
E assim subi por desesperadas 
Almas que habitavam o caminho.
Não sei dizer quanto tempo se passou.
Cheguei ao topo e vi a paz.

Hoje sou grata.
Selo o sol
E vou correr em campos verdejantes
Sem nunca olhar pra trás
Ao vale cinza.

terça-feira, 8 de julho de 2025

Prêmios Literários

Nunca ganhei um prêmio literário.
Nem ganhei sequer um prêmio 
ou uma menção honrosa.
Nunca ganhei placa ou estatueta
Nem mesmo fui lembrado por 
minhas grandes qualidades
- que estão aqui ou ao menos dizem-me.

Nunca ganhei um prêmio
Nem me disseram bom poeta.
Nem vi meu nome em meio aos grandes 
que admiro 
Nunca ganhei nada
e penso poder ouví-los rindo de mim
e dos meus blocos de versos.

Ocorre que gosto daquilo que não presta
e dos quadrados postos sobre mesa
postas sobre qualquer coisa
e canto sobre qualquer coisa.
Talvez por isso não tenha ganhado coisa alguma
nem convencido ninguém como bom poeta
mas calha que estou aqui a escrever ainda assim.

E em flor de minhas trinta e três promessas de mudança,
devo dizer que talvez nunca ganhe prêmio algum
e me chateia a chance factual de nunca figurar entre eles
De escrita livre, leve e memorável.
Mas, caso eu ganhe um prêmio,
agradeço apenas a ti
e ao fato de sempre ter gostado daquilo que não presta.

domingo, 6 de julho de 2025

Por amor

Resiste aos testes do tempo
Apenas aquilo que importa
Toda loucura se perde
Tudo que dói se conforta

Palavras balançam no vento
Sentenças caem por chão
Versos de outros momentos
Não cabem no meu coração

Perduram no meu pensamento
Tantas das nossas memórias
Encerra-se o fútil lamento
À força que tem nossa história

Tu sabes que meu sentimento
Não muda por nada no mundo
E isso é só um fragmento
De algo que é muito profundo

Sei que fui desatento
E as rodas da vida giraram
Mas canto, a despeito de tudo
Pois nossos caminhos cruzaram

Sou grato por tê-la em minha vida
Na festa ou na guerra, onde for
Na vida só o que importa
É o que se faz por amor



Milagres

Vês, o céu torna a se abrir quando teus olhos reparam
E o sol já não projeta sombras do que tu não és
Passada a tempestade, tu percebes que ficaram
Apenas os vestígios de teu cíclico revés.

Traçastes teus caminhos, em completa oposição,
Ao que o coração sabia ser a única resposta,
Tu fostes resoluto em tua contradição
E vistes que o caminho era a direção oposta.

Quem dera ser possível corrigir o teu engano
Mas tu tivestes sorte, percebendo bem a tempo
Que o teu jeito inquieto não somava ao grande plano
E deu valor sincero a quem lhe trouxe crescimento.

Tu sabes que a fortuna vem de formas diferentes
E a ti foste estendido o mais verdadeiro amor
Atente-se ao que importa, seja grato e coerente
Milagres acontecem pra quem sabe dar valor.


terça-feira, 13 de maio de 2025

Justiça

                                                                             Distâncias 

Contemplo silenciosamente tua ausência,
Enquanto limpo a poeira de tudo aquilo que me cerca.
Tu deixastes marcas fundas nisso tudo,
Seja por lembrar de ti nesta cadeira velha
Ou de quando sentamo-nos na varanda de frente,
Amaldiçoando a vida que nos fizera assim,
Mesmo que houvesse em nós um prazer perverso
De guerrearmos, em palavras e afagos, por muitas e muitas noites.
Sim, querida, tu fazes falta.

Recordo-me ainda de como tudo começou entre nós,
Tu me eras como um capricho novo, daqueles com jeito pra causar grandes estragos.
Sabes como sou e como gosto dos estragos,
Não poderia haver por ti
- Além da clara curiosidade mórbida -
Senão um senso de amor profundo e sério,
Com efeito de tudo aquilo que representas para mim:
Tua pessoa e o cuidado que demandas o trato
De ti, meu animal raríssimo.

Diante de tudo isso, devo dizer que crescemos à parte um do outro,
Não é mesmo?
Por muito anos acompanhei teu sorriso e olhares distantes
- Tu sabes que sempre tive queda por teus olhos -
Como uma recordação retumbante do fracasso de minha pessoa.
Digo também que mereci,
Afinal crescemos à parte, os dois a despeito do tempo, do silêncio,
Da distância...
E embora doa-me saber, de dentro de mim, que dei as costas a felicidade,
Sei hoje que a marca da loucura me trouxe aprendizado
E passei a guardar-lhe (ou aguarda-lhe) com carinho,
Ignorante das chances que me vinham logo em frente.

E tu era apenas uma criança,
Deveria ter me ocorrido que o tempo constrói tudo,
Em lugar da simples negativa, por vezes repetida,
De que não eras para mim, de que não era para ser,
De que o amor já havia sido desperdiçado.

Poderia decorar esta memória com uma centena de versos tristes,
De canções tristes, de momentos tristes, daqueles dias mais tristes que vieram,
E tu e eu sabemos que nosso acervo de tristezas é vasto, meu bem.
Mas alegra-me saber que eles vieram e que foram contigo,
Alegra-me recordar de teu corpo no mar, de teu sorriso no sol,
Das inúmeras ligações trocadas,
E tudo aquilo que construístes, à parte de mim, mas que me enquadrava perfeitamente.

Num movimento delicado de minha pena,
Adiciono-lhe, em definitivo, às minhas viagens repartidas,
Afinal tu és uma parte tão imensa do que eu sou,
Talvez não saibas:
Hoje sigo acompanhando teus olhares
Em sonhos saturados de saudades.

Talvez a vida nos reserve um recomeço em outro dia,
Talvez a marca do passado seja a sorte escancarando teu riso,
Talvez tenha amado de menos e feito de menos por ti
Do que agora a justiça do cognac me propõe,
Mas de ti todas as memórias são incríveis,
Senhora distante, 

Mas tão próxima de mim.





segunda-feira, 1 de julho de 2024

Who am I from the back?

Once again you saw me leavin’ And again you start believin’ That someday I might be back But I left you now forever And I guess it’s now or never So I’ve really got to ask Who am I from the back?

Is the lack of hair that matters

Or the fact I’m wearing black

Please, you got to tell me

Who am I from the back?

As we’re leaving Philadelphia

For that old Chicago shack

Who am I from the back?


I know I’m not the same

As I walk out through that door

But I don’t know what became

Of the man I was before

It feels like I lost track

Or inside I have a crack

'Cause I may never know

Who am I from the back


You may not understand me

Or the places I’ve been at

But only you can tell me

Who am I from the back

I know it means so little

As you hope for love instead

But the only thing I offer

Is that glance into my back


One day I bought a mirror
What I saw made me mad

I looked into my face

And that face smiled back

I don’t know what became

Of that smile I used to wear

But actually doesn’t matter

Cause it’s never coming back

So you may even ask me

What’s the point of feeling sad?


I don’t know what I run from

I don’t know when to stop

But when I saw you crying

Well, it really hurts a lot

I know I’m not the same

So I’ve really got to ask

Who am I from the back?


quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Confraria

                                                                                                Prelúdio

    

Esvazio-me, como de costume, 

No clímax de outra madrugada desperdiçada entre excessos e promessas.

Solenes companheiros de esquina, trajetos repetidos,

E a conhecida sensação de sermos apenas nós, amigos do acaso, 

Contra toda sorte de transtorno que a vida tem a oferecer...

Ao fim, resta remorso,

Não por qualquer traço de moral que os inomináveis detentores da sociedade

Garantem, vergonhosamente, ser um único caminho para o céu,

Mas por saber que nosso cinismo já nos deixa mais próximos do inferno.


Viver é fácil, 

Basta deixar que o vento sopre e as tempestades caiam, 

No meio tempo tudo é só uma trovoada,

Um relance breve de uma eternidade vaga,

Um sopro fresco ou um choque forte,

Qualquer caminho serve quando nada leva a lugar nenhum.


Retas traçadas, viagens repartidas, sonhos que temos adiado pela falta de coragem.

Busca aí outra resposta, qualquer coisa que não fale de energia

E da vontade incognoscível de seres míticos.

Esta confraria reúne-se para admirar os mais belos fracassos,

E a culpa é de cada um de nós.


A César o que é de César, 

A Ulisses o que é de Ulisses,

Ou Douglas, Daniel, William, Leopoldo, 

Aqueles que podemos citar os nomes,

Todos nós merecemos as moedas de prata que o traidor recebe,

Por buscarmos, incoerentemente, uma saída para baixo

Enquanto contemplamos a Lua,

Os astros,

O vazio que nada mais pode preencher.


O que temos é lindo,

Patético, mas lindo,

Pouca coisa importa quando esvaziamos latas e frascos,

Recipientes sórdidos de angústia,

Prostrados em um presente com aspecto de passado,

Repetindo a punição, porque é tudo o que conhecemos.


Mas a madrugada acaba ao som da última moeda,

E logo voltamos à realidade das coisas,

Tudo aquilo que escolhemos ignorar e logo deixa de existir,

Afogado pela escuridão da noite e o silêncio das casas vizinhas.

Prelúdio de memórias fictícias,

Afinal, o que é real esconde-se muito além desta esquina,

De qualquer praça ou padaria,

E já não me interessa nada que eu possa viver de forma prática,

Hoje só quero sonhar.

sábado, 12 de março de 2022

Viagens Repartidas

Fria lâmina que busca minha pele, 

Sem conceder nem mesmo a torpe despedida,

Quebra o silêncio com meus versos tão fatais,

Doces promessas de alívio e solitude.


Houve um tempo de ternuras e paixões,

Vastas noites em que me desfiz em partes,

Memórias cintilantes deste triste devaneio

- A vida apenas - em sua face mais brutal.


Restas tu, como registro de minha sorte,

O fio de navalha firme, operador deste milagre,

Repartindo minha partida entre os que ficam

Enraivecidos pelo encontro com o destino.


A viagem acabou, minha companheira,

Tu permaneces deste lado, de cruel realidade,

Enquanto rendo-me ao sonho de outra vida.

Já não podes seguir-me ao derradeiro abismo.

domingo, 6 de março de 2022

Sobre as Sombras

Impropérios foram ditos, verdades não foram à tona

E o silêncio fez morada pelas sombras de teu bosque.

Tu partistes a buscar um outro amor que, enfim, enrosque

E deixou apenas eco das poesias que eres dona.


Vasta é a literatura que o teu nome menciona,

Sobre ela... os românticos tem escrito há tanto tempo,

Tal qual musa enfeitiçada, congelada no momento,

Quanto amor há de se achar nos versos que ela coleciona.


Certa vez, disse-me um mago, que tu havia de voltar

E reocupar os sonhos dos poetas ainda a vir,

Desde então olho as janelas na esperança de surgir

Qualquer sinal que indique que estás prestes a chegar.


Sobram muitas palavras, que são só pra disfarçar 

A ilusão que vou nutrindo na espera de um romance.

Sei que tu ergue-se ao céu e não há sombra que te alcance,

E nós, poetas, somos sombras, sem tua luz pra iluminar.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Brevemente

Quisera poder apontar-lhe em um só verso
Inúmeras questões que lhe afligem, pobre alma,
Pontuar, calmo, a série larga destes medos que cultivas
A ponderar, mineiramente, esta ressaca em tua vida
Que lhe acompanha, fielmente, desde outros carnavais,
Mas falta tempo.

Proponho tão somente a certa máxima,
Que tua esquiva prepotência já não poderás fugir,
Ao menos sabes de si mesmo, a ponto de não ter resposta
E, ainda assim, sentar-se a mesa com qualquer que te retruque?
Tu sabes que és culpado por tua própria decadência,
Então porque dói tanto em ti que seja outro que lhe diga?

Te fizestes herói, detetive, errante, mesmo quando sabias
Das respostas desde o início, alimentando a ficção, recriando
Cenários a troco de nada - quer dizer - a troco de muito tempo,
Permanentemente jogado fora, enquanto tu, ó pobre vítima,
Chafurdava nesta lama, com o gosto pecaminoso da indiferença,
Farta sobremesa ao teu azedume, este desgosto que emulas.

Digo-lhe que erga-te, de que maneira não me importa,
Mas dá-me certa ojeriza ver-te tão largado às traças,
Tu, que outros ainda teimam em defender, sem ter razão,
Tu que despencas, de propósito, sempre do mesmo 
Precipício, só por saber que após a queda, a cama
Quente ainda te espera.

Trata de ser forte, que nem mesmo a fantasia
Concebe este teatro, este retrato mal tirado
De tuas velhas intenções, conto antigo, adulterado,
Em que se retira a essência arquetípica proposta,
Pasteurizando toda a trama pra vender uma moral
Que nunca te disse nada, convenhamos.

Pobre herói...
Que preso à sina de salvar qualquer donzela
Se afoga em drama e desvirtua a própria sorte,
Até restar somente o espelho objetivo
Que só reflete eternamente uma questão:
Salvas a ti ou esta que tu mal conheces?


quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Protesto ao vento

                                    à amiga Viviane Joslin


Tu e eu éramos outros, 
Jovens e impetuosos, diante de uma estrada longa
E de temperamentos mais curtos do que, em geral, considera-se certo.
Do alto de um praça alta, observando a cidade baixa,
Com um senso de nobreza - que há tanto nos deixou -
Sentados frente a frente, como quem prestava-se a observar sinais de fogo,
Mesmo que tudo que enxergássemos fosse apenas fumaça,
Provavelmente dos cigarros já queimados
Ou das ideias exploradas em excesso
[Como sinto falta dos excessos],
Debatendo concertos e comédias, os meus desacertos
As tuas tragédias.

Tu vinhas, brisa leve, de caprichos peculiares
E eu todo ventania, soprando forte as tuas certezas,
Deste acaso fez-se encontro e todo vento veio ver,
Que da sarjeta mais suja desta Rua Sergipe
Nasceu um belo monstro, de grandeza até então desconhecida,
Mas que já prometia o caos
E a fúria, em todos os seus empreendimentos.
De fato nosso encontro incomodava muita gente,
O que tornava tudo deveras divertido,
Aos teus sacros olhos cor de mar
E às minhas tempestades e ondas nos cabelos.

Depois deste tornado, havia ainda tempo para repousos,
Intervalos usados para aprofundar o lobby gratuito que fazíamos
Em defesa de uma vida sem valores,
Cruzando bares, praças e avenidas, convencendo a todos que nada
 - e ninguém -
Poderia convence-los de qualquer coisa, pois nosso objetivo nunca fora este,
Apenas oficializar uma forma menos nociva de levar as coisas,
Em que a pressão do meio não nos atingisse,
Ou ao menos não nos importasse.

Em outras noites reuníamos neste velho centro,
Deixando-nos tomar por uma buliçosa angústia,
Sentimento intrinsecamente mineiro, mas que preenchia teu ser paulista
E meu coração capixaba,
Um tédio daqueles bares e das tantas faces repetidas,
A ti - e a ti somente - ainda despontava um interesse diariamente renovado,
Pela vida, pelas narrativas, por estes pobres condenados,
E quando vinhas, com estes teus olhos brilhantes, me contar das tuas aventuras,
De safanão resgatava-te antes que fosse tarde
E tu caísses de paixões ou desajeitos, coisa muito sua.
A mim não interessavam os outros,
A não ser que os outros fossem tu ou 
Penaforte, algumas vezes o Inácio e a Cruz de Sá,
E quiçá aquele outro amigo, o tempestuoso,
A que chamo Oliveira.

E por longos anos nutrimos estas poesias dolorosas,
Entre sonhos e pesadelos - talvez até alguma realidade -
Nos encontramos diversas vezes, quando os astros convergiam
Ao encontro de Gêmeos e Libra. 
Pouco sei - e nada me importa - destes fenômenos astrológicos,
Mas reconheço a importância das estrelas em minhas noites,
Principalmente nas noites que passamos juntos,
Eu e tu.
O que fizeram de nós, amiga?

Tanto vento nos levou a outras vidas, novos endereços,
Cada vez mais distantes, tornaste-te senhora de si,
De pensamentos alinhados e teorias que não entendo bem,
Eu retomei o tédio de minha Vila Velha, e tenho escrito 
Estas memórias sem forma, deixando-me levar, principalmente,
Pelo sopro da afetividade.
Já nem mesmo me importa o que, de fato, vivemos juntos,
Há quem diga que tudo isso não passa de ficção,
Mas nós estávamos lá, guardo com carinho o teu sorriso sombreado,
As cifras tatuadas em tua mão esquerda,
E a torpe sensação de ter deixado o tempo passar,
Sem ter ao menos escrito um protesto ao vento,
Que nos uniu, mas também nos separou.


Já fazem tantos anos, tu e eu éramos outros.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Os Sensatos

Dizem por aí que pensas em fugir
Pensas em criar estrada aonde o sonho já não chega,
Que se assustou com a correnteza, com as certezas a ruir,
E agora busca um outro palco pra tua tragédia grega.

Dizem por aí que tu já fostes outro homem,
E que entrou nestes buracos, pois sabia achar saída, 
Hoje a luz não chega ao fundo, hoje medos lhe consomem,
E os amigos bem duvidam da figura tão sofrida.

Dizem por aí que tu perdestes as chances,
E que não vai ter outro jeito, que o tempo vai cobrar,
Vai tirar o teu conforto, vai matar outros romances,
E acabar com toda forma que tens pra recomeçar.

Mas que chance tens se tu aceitas?
Se te rende às maldições e às consequências de teus atos?
É melhor tentar a glória que viver só de suspeitas,
É melhor ser doido e só que viver entre os sensatos.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Domador de Destinos

Encantador de demônios, tu, domador de destinos,

Filho de abismos e sonhos, distantes, mas tão parecidos,

Perdidos, teus planos e enganos, perdidos, teus poucos caminhos.

Forjado, trocado e esquecido, tu segues agora o teu próprio instinto.


Basta falar de si próprio, não bastam os séculos idos.

Não bastam revoltas e tramas dentro dos ciclos que tens repetido.

Basta amar teu monótono e óbvio utópico desfecho escolhido,

Nunca cumprido, trâmite interno, que a ti soa tão específico.


O futuro não aguarda ninguém, sobrepõe-se, insolente, ao presente,

E tu, que és tão conivente, nem sabes que vens permitindo,

O ar vai aos poucos sumindo, os medos vão te consumindo

E preso em delírios de feras, tua alma se vai diluindo.


Quem brinca com fogo se queima, quem ora por sombras se apaga,

Quem tudo quer, ganha nada, e, disso, tu já sabes bem...

Benção é a noite de sono, glória é o sol da manhã,

Graça é ser quem tu és, a despeito do amor de outrem.


Eras sobre eras se somem, pelo poder que o tempo tem,

Tudo que passa cumpre o propósito e poucos enxergam além.

Orfeu se perdeu por bem menos e tu ainda olhas pra trás,

Mais vale esta dor que te faz recordar daquilo que vives também.


Falta-lhe apreço, gratuito e sincero, por si, por sua história, por tudo,

A estrada tomada é difícil, mas o chão foi por outros batido

Alegra-te por estares vivo, as chances, de certo, virão

Crê, sobretudo, em tua força, esquece os pecados já cometidos.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Filhas da Terra

Tu conceberias senhores do tempo?

Conceberias criadores de universos?

Crês, dentro do peito vacilante, que alguém controla o clima destes dias?

Vês as tempestades e os mares que se abatem sobre os homens

E ignoras o poder da terra.




Não posso amar os símbolos criados por homens

Que nunca entenderam a natureza.

Corpos reunidos em templos de pedras,

A ver, através de vitrais, um mundo que julgam dominar,

Encomendando preces e benções,

Pequenos fragmentos dessa luz que os cega.

Almas pequenas de ingratidão,

A vós que o jardim foi criado, a vós que ele serve,

Cada emaranhado de folhas secas que descansa no solo deste bosque

Conta uma história,

Em nenhuma delas há deuses.




Tua pequenez não permite sonhos grandiosos,

Das façanhas mais humanas, das possibilidades inerentes

Apenas aquilo que nós vivemos.

Tua simples mente domada reproduz devaneios

De ninfas e sereias, de anjos que nos regem,

Do senhor furioso que escreve as leis da tua vida.




Mas as nuvens não têm senhores,

Servem apenas ao ciclo comum de todas as coisas.

As ondas se levantam muito além do que tu pensas,

Muito além do que teus olhos podem perceber,

E tudo conecta-se, o céu e o mar,

Estamos todos ligados,

Tu temes a tempestade e a fúria,

Apenas me reconheço.




Ainda não conheci a fé que move montanhas,

Mas tenho visto montanhas por todas as partes,

Como poderia crer na fé dos homens?

Reverencio meus verdadeiros antepassados,

Pequenas criaturas de um vasto oceano.




Renegarei tuas profecias até o fim,

Eu quero a fé orgânica, a crença natural,

Quero a prece dos rios, o rito dos solos, todo o misticismo dos mares,

Vou aprender aquilo que as raízes ensinam,

Olhar a lua enquanto a noite se estende e despertar o sol,

Quero meditar na brisa serena,

Todo este planeta é meu lar.




Não travo batalhas com o tempo, amo aquilo que não permanece,

Tudo que existe é o aqui e o agora,

Do meu passado levo apenas a memória,

E meus olhos aceitam com doçura até mesmo o que não compreendo.




Teus deuses tem nomes e séquitos,

Estátuas de mármore e versos em línguas,

Os meus estão por toda parte,

Nem mesmo precisam de mim.

Deixo os homens e suas divindades,

Nós somos filhas da Terra.

domingo, 12 de dezembro de 2021

Promessa

Em certas noites, tudo em mim queima por dentro

E eu vou buscar o alento destes velhos conhecidos,

Amores esquecidos, coisas de outros momentos,

Frágeis monumentos destes tempos já perdidos.


Sei que sou amargo, tantas vezes me arrependo,

Mas não vou viver sofrendo a minha segunda vida,

Vou buscar outra saída, vou continuar crescendo

E florescendo estas poesias tristes e sem cabimento.


Este, aquele ou qualquer outro, nada disso diz de mim,

Só quem fica até o fim tem direito de falar...

Previsões pra descartar, só eu sei a que vim,

E não há arcanjo ou serafim que hoje possa me parar.


Não volto a ser quem era, vou continuar mudando,

Pouco a pouco acrescentando outras faces nesta peça,

Só quero o que me interessa: endoidar de vez em quando,

Sem deixar um memorando, sem fazer qualquer promessa.


sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Se a vida fosse justa

                                                                Ao Amigo Ernesto Penaforte


Se a vida fosse justa, nós, meros mortais neste templo,

Nem mesmo conceberíamos.

Afinal, que é que podemos saber, amado irmão?

Ao fim da curva, a estrada se estende ao infinito,

E nem mesmo sei quanto deste caminho percorreremos lado a lado.


Paredes erguidas de concreto e sonho, 

Uma cidade inteira em que nós dois, a despeito do tempo

                                            e de qualquer responsabilidade]

Inúmeras vezes desbravamos,

Tu contava-me de afeto e ternura,

Eu empilhava os corpos das vítimas de teu charme,

Mas tudo estava bem, os mortos não tem sentimentos

E você tem demais.


Por isso é que digo, a tu somente, meu amigo,

Que se a vida fosse justa, nenhum de nós saberia.

Desenganados novamente pelas expectativas

                                        de sucesso, de holofotes, 

                                        de quartos de hotéis destruídos]

E as filas de pessoas a ir e vir

Das quais jamais nos lembraríamos dos nomes,

Apontando ao Penaforte ensandecido

A tirar frascos dos bolsos do paletó,

Transbordando interesses mesquinhos,

Mesquinhos como nós.


Como eu te amo, meu querido amigo, amo a ilusão que criastes

De que eres qualquer coisa além de um patife,

Me faz acreditar, mesmo que por pouco tempo, que há de fato

                                                     algo de bom no mundo]

Afinal, onde é que encontraria, em um mundo repleto de patifes

Canalhas amontoados em mesas de bares no centro da cidade,

Um outro patife como vós?


Quisera, porém, compartilhar da fé inabalável,

Vós, o verdadeiro publicitário da cristandade,

Cavaleiro desmontado de uma cruzada inútil,

Pois os Deuses nunca lhe pediram nada...


Ainda assim, tu levantas o estandarte do passado

E vai reler os clássicos em seu tempo livre.

Um nobre vagabundo - se me perguntas - é o que tu és,

Da mais alta estirpe dos calhordas dessa terra,

Enganando a quem quer que saiba ler,

Com essa classe de lorde inglês no verão de dez mil sóis 

                                                   desta antiga Vila Velha.]


A natureza realmente é admirável.



segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

De Outrora

                                                                       Ao Amigo Matheus Oliveira


Amigo, confesso que sinto saudades,

Não deste que tu se tornastes, jamais,

Daquele que há muito deixastes pra trás,

Convencido de não possuir qualidades


Tu, o de outrora, de tantos assuntos pendentes,

Grosseiro a seus modos, omisso, de certa forma pedante,

Que mesmo afundado em mau humor ainda era interessante,

Que destes lugar a esta figura, de tédio completo e evidente


Tu, o de outrora, de tantos amigos e amores

Que nunca negava abrigo, cerveja e poesia

Que ainda conversava, com tudo que conseguia...

Hoje escondido em receios, enclausurado em rancores.


Vê se volta a ser quem era, ou ao menos tenta,

Pois nossos amigos lamentam teu presente conturbado,

No fundo, tu bem sabes, que és melhor ao nosso lado

Vem e escreve logo, sobre a saída da tormenta.


sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

Corpo e Alma

                                                        À amiga Beatriz Cruz de Sá


Dias em silêncio, noites de ternura,

Nestas armaduras, que chamo de corpo,

Tu estendes um lenço, sabes que a vida é dura

E que não há bravura que me cure por dentro


Muito foi falado, pouco me foi dito,

E eu corri perigo, só porque sentia tédio.

Muito foi falado, nada foi ouvido,

Meu ópio favorito é a ausência de remédio.


Mas você permanece, em silêncio, ao lado meu

E já não tenta amar outra pessoa, que não sou.

Renovo minha prece, vou negociar com Deus,

Aceitar que aconteceu e esquecer o que passou.


Se ao menos eu pudesse te abraçar de corpo e alma,

Concordar, com calma, que estes males vem pra bem.

Se ao menos eu pudesse te abraçar de corpo e alma,

Coração, vê se te acalma, outro amor não me convém.